quinta-feira, 20 de junho de 2013

PT: não dá mais pra ficar de bem com todo mundo...


Tarso Genro ouve dúvidas e reivindicações de ativistas e setores da mídia




Foto: Caco Argemi/Palácio Piratini


Débora Fogliatto no SUL 21

Representantes de movimentos sociais e de setores da mídia dialogaram com o governador Tarso Genro nesta quinta-feira (20), no Palácio Piratini. Na edição do Governo Escuta com o tema “O que dizem as ruas?”, ativistas do Rio Grande do Sul e, através de teleconferência, de diversos lugares do país, trouxeram suas reivindicações e expuseram seus pontos de vista. Eles foram ouvidos pelo governador e pelos secretários Vinícius Wu, da Secretaria-Geral de Governo, que mediou o encontro, e Marcelo Danéris, do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do Sul. O debate também foi transmitido pela internet e contou com a participação de internautas pelas redes sociais.

Estiveram presentes presencialmente o jornalista Marco Weissheimer, do blog RSUrgente e colunista doSul21; Marcelo Branco, ativista digital; Fernanda Quevedo, do Fora do Eixo; Rodrigo Barcellos, membro do Bloco de Luta pelo Transporte Público; Igor Natusch, editor do Sul21; Fernando Costa, membro do Defesa Pública da Alegria, e o jornalista Gabriel Galli. Foram convidados via hangout o editor da Carta Capital, Lino Bocchini, o estudante da UFF/RJ Luiz Felipe Garcez; Bruno Torturra, membro do Existe Amor em SP; Vitor Vidal, do Movimento Passe Livre de Fortaleza; e Roger Ruan, estudante de Geografia do Instituto Federal do Pará.

O primeiro a expor seu ponto de vista foi o jornalista Marco Weissheimer, que abordou a questão das polícias militares e do crescimento das agendas fundamentalistas no Brasil. Ele acredita que existem atualmente algumas pautas que representam um retrocesso nos direitos humanos e colocam em risco os movimentos sociais, como “o projeto esdrúxulo da cura gay”. “Me parece que as recentes manifestações representam a oportunidade para discutirmos também esses riscos”, sugeriu.



Foto: Caco Argemi/Palácio Piratini

Pela internet, Bruno Torturra falou de São Paulo a respeito do papel decisivo do cidadão conectado, que se tornou “um verdadeiro repórter” das manifestações. Da mesma forma, Marcelo Branco também citou a importância das redes sociais nos movimentos, adquirindo a elas o poder de articulação das manifestações modernas. “Existem características em comum (das manifestações atuais) com outros movimentos, como as manifestações de 2011 na Tunísia, na Espanha, em Wall Street. São movimentos de massa nas ruas, são indivíduos multimídia conectados em rede, sem organizações representativas”, opinou. Torturra mencionou outra semelhança entre “todas as primaveras do mundo”: a brutalidade policial e a crise da credibilidade dos meios de comunicação. Ele questionou se isso poderia tornar urgente a reforma política e a democratização da mídia.

Luiz Felipe falou do Rio de Janeiro, lembrando também das ações da Polícia Militar nas favelas. “Aqui no RJ e em todo o Brasil sabemos que a juventude das favelas é criminalizada. A polícia precisa passar por uma desmilitarização urgente”, afirmou. Marcelo mencionou também a violência policial, desde o episódio em que manifestantes protestaram contra o Tatu Bola e foram reprimidos brutalmente. A respeito da ação da Brigada Militar nesse ato e nos recentes protestos, o governador respondeu que o estado está se esforçando para que haja uma nova formação na entidade. “Isso está sendo construído, mas não muda de um dia para o outro. Os embates às vezes são provocados por erro da organização policia, eu admito, como aconteceu no episódio do Tatu Bola. Mas os manifestantes precisam entender que o policial não está ali para agredi-lo”, afirmou Tarso.

Uma das vítimas de violência policial no último protesto que tomou as ruas da capital, na última segunda-feira (17), o jornalista Gabriel Galli deu seu depoimento, relatando ter sido agredido pela Polícia Militar e ter tido seu cartão de memória do celular confiscado. “Eu e meu companheiro fomos sumariamente agredidos pela PM numa abordagem clara de censura, no momento em que estávamos gravando uma ação de dois policiais militares que espancavam uma pessoa”, contou. O governador afirmou a importância de ouvir relatos como o dele e de que isso seja apurado para que os responsáveis sejam identificados. Questionado a respeito da atuação da Brigada Militar nos protestos desta quinta-feira (20), Tarso admitiu que “lamentavelmente” não pode garantir que a BM agirá sem violência. “Não temos o controle direto isso. Mas garanto que essa é a nossa orientação”. Ele ainda disse que a Brigada irá distribuir panfletos que pedem a colaboração dos manifestantes para que não haja violência nos protestos de hoje.

O integrante do Bloco de Luta pelo Transporte Público, Rodrigo Barcellos, afirmou que a criminalização dos movimentos sociais é fruto da “criminalização da pobreza”. “A polícia continua a ser violenta com os pobres, os pretos, todos os dias nas vilas. A gente não sabe, e acho que o governador também não, como é a formação desses brigadianos”, opinou. Os participantes defenderam o fim da Polícia Militar no país, proposta inclusive por uma PEC do petista Raul Pont. O governador afirmou ser a favor da medida, mas lamentou que o governo “não tenha maioria” para aprová-la. Ele pediu que pessoas que sejam agredidas se dispunham a “dialogar com os operadores”.



Foto: Caco Argemi/Palácio Piratini

A respeito das manifestações, o governador demonstrou preocupação sobre as pautas dos movimentos. “Tem muita gente que olha (para os protestos) como uma oportunidade para transitar suas teses direitistas”, alertou. O editor doSul21, Igor Natusch, defendeu que sejam apresentadas soluções mais imediatas para problemas pontuais. “Não podemos usar o fato de que existem muitos discursos para dizer que não se sabe o que se quer. Seria interessante no caso do transporte público se o governo dissesse como transformar o transporte em um direito fundamental, e não ferramenta de lucro”, expôs. Da mesma forma, Luiz Felipe também trouxe esse assunto, criticando a mídia, que estaria tentando pautar o movimento a seu interesse. Rodrigo criticou a mudança no caráter dos protestos iniciados pelo aumento das tarifas de ônibus. “Queremos tarifa zero, e não serão os meios de comunicação da direita que mudarão nossas pautas”, declarou.

Em relação às grandes empresas de comunicação, Tarso foi questionado a respeito da ação da Brigada Militar para proteger o prédio do jornal Zero Hora durante o último protesto. “O dever da polícia é defender pessoas que estejam com possibilidade de ser ameaçadas. Se tivemos ameaça a qualquer prédio que coloque em risco a integridade de pessoas que estão lá, precisamos proteger as pessoas que estão lá”, esclareceu.

O governador sustentou acreditar que a democracia ocidental está passando por três crises, que são: de representação política, dos partidos políticos e do modo de vida dentro do sistema capitalista “consumista e predatório”. De acordo com ele, o “capital financeiro capturou o estado”. Ele defendeu uma profunda reforma política com mecanismos de participação direta da sociedade. O fato de que as pessoas precisam sair de casa de manhã cedo e irem “esmagadas em um ônibus” para o trabalho representa o modo de vida “carente e angustiante” gerado pela sociedade de consumo.

O editor da Carta Capital, Lino Bocchini, disse que o PT pode tirar proveito da situação atual. “Não vai mais ser possível fazer acordo com todo mundo. Não se pode estar bem com fazendeiro e com índio, com bancada evangélica e movimentos sociais. O PT sempre esteve do lado das ruas, e tem uma oportunidade de voltar a sua origem”, defendeu.

Marcelo Danéris, secretário do CDS, disse que há uma crise de representatividade e um processo de criminalização do partidos. Iniciativas como esse diálogo são uma forma de repensar esse sistema de modelo, garantiu. Tarso propôs a construção de um organismo, virtual ou real, em que se possa canalizar as críticas para aperfeiçoar o trabalho. “Acho que as informações que chegam para o senhor, governador, não são totais. Mas acho que foi inédito o que aconteceu aqui, no Brasil e talvez no mundo”, afirmou Marcelo Branco.

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