terça-feira, 4 de janeiro de 2011

cenário sombrio da economia mundial em 2011 (2)

O que nos espera em 2011, segundo Stiglitz



Por Luiz Lima
Amig@s,
Segue uma tradução ao português do artigo recolhido aqui e publicado originalmente aqui.
Curiosamente, não há uma única e escassa linha sobre o Brasil. Será que Stiglitz nada tem a dizer sobre o País... ou não estamos mesmo com essa bola toda?
Boa leitura a todos. 

O que nos espera em 2011?

Por Joseph Stiglitz

A economia global chega ao final de  2010 mais dividida do que no início do ano. Por um lado, países emergentes como Índia, China e as economias do Sudeste Asiático estão experimentando um forte crescimento. Por outro lado, a Europa e os Estados Unidos enfrentam um impasse, na verdade, um mal-estar ao estilo japonês e um desemprego teimosamente alto. O problema nos países avançados não é uma recuperação sem empregos, mas uma recuperação anêmica. Ou pior, a possibilidade de um novo mergulho na recessão.

Este mundo de duas pistas apresenta alguns riscos incomuns. Embora a produção econômica da Ásia seja muito pequena para impulsionar o crescimento no mundo, pode ser suficiente para empurrar para cima os preços das matérias-primas.

Enquanto isso, os esforços dos Estados Unidos para estimular sua economia através de uma política de “flexibilização quantitativa” podem falhar. Afinal, nos mercados financeiros globalizados, o dinheiro sai em campo procurando as melhores perspectivas em todo o mundo, e estas perspectivas estão na Ásia, não na América. Assim o dinheiro não vai para onde for necessário, e muito dele irá parar onde você não gostaria, causando aumentos nos preços dos ativos e matérias-primas, especialmente em mercados emergentes.

Dado o elevado nível de desemprego na Europa e nos Estados Unidos, é pouco provável que a “flexibilização quantitativa” implique num surto inflacionário. Pode, no entanto, causar o aumento da ansiedade sobre a inflação futura, o que por sua vez pode conduzir a maiores taxas de juros no longo prazo, precisamente o oposto do que busca o Banco Central dos EUA.

Este não é o único risco de impacto negativo, nem mesmo o mais importante para a economia global. A maior ameaça vem da onda de austeridade que está varrendo o mundo, com governos, particularmente na Europa, enfrentando os grandes déficits decorrentes da Grande Recessão, enquanto a ansiedade sobre a capacidade de alguns países para satisfazer os pagamentos da suas dívidas contribui para a instabilidade dos mercados financeiros.

O resultado do aperto fiscal prematuro está praticamente anunciado: crescimento lento, diminuição das receitas fiscais e decepcionantes reduções dos déficits públicos. E, no nosso mundo globalizado, o arrefecimento na Europa exacerbará a desaceleração nos EUA, e vice-versa.

Numa situação em que os Estados Unidos podem pedir emprestado a juros baixos sem precedentes, e diante da perspectiva de altas taxas de retorno para os investimentos públicos, após uma década de abandono, o que deve ser feito parece bastante claro: um programa de grandes investimentos públicos que estimulariam o crescimento do emprego no curto e longo prazo e que, em última análise, resultariam numa redução da dívida nacional. Mas os mercados financeiros já mostraram sua miopia nos anos que antecederam a crise, e voltam a fazê-lo, pressionando por cortes de gastos públicos, mesmo que isso signifique reduzir drasticamente os investimentos necessários.

Além disso, o nó político assegura que pouco se faça com respeito a outros assuntos prementes para a conomia americana: as execuções hipotecárias provavelmente continuarão com toda a sua fúria (deixando de lado as complicações legais), é provável que as PMEs sigam privadas de recursos, e é possível que os bancos pequenos e médios  que tradicionalmente lhes ofereciam crédito tenham de continuar a lutar para sobreviver.

Enquanto isso, na Europa é pouco provável que as coisas corram melhor. A Europa finalmente conseguiu sair em resgate da Grécia e da Irlanda. Na véspera da crise, os dois países estavam sob governos de direita, marcados por um capitalismo de conivência ou pior, demonstrando mais uma vez que a economia de livre mercado na Europa não funciona melhor do que nos Estados Unidos.

Na Grécia, como nos Estados Unidos, a tarefa de arrumar o país recaiu sobre um novo governo. Aparentemente sem surpresa, o governo irlandês,  que incentivou a concessão de empréstimos bancários irresponsáveis e a criação de uma bolha imobiliária, não foi capaz de lidar melhor com a economia após a crise do que antes dela.

Deixando de lado a política, a bolha imobiliária deixou para trás um legado de dívidas e um excesso de capacidade instalada que não poderá ser facilmente corrigido, particularmente quando os bancos, com sua influência política, se recusaram a reestruturar as hipotecas.

Para mim, discutir as perspectivas econômicas para 2011 não é um assunto particularmente interessante: a resposta é desalentadora, com baixas perspectivas de melhora e grande risco de piora. O mais importante é: (1) quanto tempo vai levar para a Europa e os Estados Unidos se recuperarem; e (2) poderão as economias da Ásia seguir dependentes das exportações para manter o crescimento se os seus mercados históricos definham?

Meu melhor palpite é que esses países vão manter um rápido crescimento na medida em que desviem o seu foco económico para seus mercados internos, vastos e inexplorados. Isso exigirá uma reestruturação significativa de suas economias, mas a China e a Índia são países dinâmicos e deram provas de resistência em resposta à Grande Recessão.

Não sou tão otimista com a Europa e os EUA Em ambos os casos, o problema subjacente é a demanda agregada insuficiente. A maior ironia é que há, simultaneamente, uma capacidade de produção excessiva, vastas necessidades não satisfeitas e políticas que poderiam restabelecer o crescimento se usassem esse excesso de capacidade para satisfazer essas necessidades.

Tanto os EUA como a Europa, por exemplo, devem adaptar suas economias para enfrentar os desafios do aquecimento global. Existem políticas factíveis que funcionariam num contextro de limitações orçamentárias de longo prazo. O problema é político: nos Estados Unidos, o Partido Republicano prefere ver o presidente Barack Obama fracassar do que testemunhar um sucesso económico. Na Europa, 27 países com interesses e perspectivas diferentes atiram para todos os lados, sem solidariedade suficiente para compensar. Os pacotes de resgate, vistos nesta perspectiva, são conquistas impressionantes.

Tanto na Europa como nos EUA, a ideologia de livre mercado, que  permitiu o surgimento de bolhas de ativos descontroladas – os mercados sempre sabem mais, por isso o governo não deve intervir – amarra agora as mãos dos decisores políticos na hora de articular uma resposta eficaz à crise. Pode-se pensar que a própria crise iria minar a confiança nessa ideologia. Porém, pelo contrário, ela voltou à tona, para arrastar os governos e as economias pelo ralo da austeridade.

Se a política é o problema na Europa e nos EUA, o provável é que somente mudanças políticas recoloquem essas regiões no caminho do crescimento. Caso contrário, podemos esperar até que a ameaça do excesso de capacidade se desvaneça, que os bens de capital se tornem obsoletos e as forças internas capazes de restaurar a economia comecem globalmente a pôr sua mágica para funcionar. Em qualquer dos casos, a vitória não será alcançada ao dobrar a esquina.

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