segunda-feira, 6 de junho de 2011

Coojornal... lembram?

Coojornal, a cooperativa que incomodou a ditadura

Sul 21 

 


Associados e colaboradores da Coojornal em frente à sede na rua Comendador Coruja, em 1980 - Foto: Eduardo Tavares / Coojornal

Nubia Silveira *

Numa noite brasiliense de maio de 2007, quatro jornalistas gaúchos se reuniram numa casa do Lago Norte para fazer duas das coisas de que mais gostam: falar sobre jornalismo e saborear uma boa carne. O maître anfitrião, Luiz Claudio Cunha, e os amigos convidados, Geraldo Hasse, Luiz Lanzetta e Osmar Trindade, tinham muita coisa em comum. Além de terem trabalhado em vários jornais do Brasil, participaram de uma experiência marcante do jornalismo, na época da ditadura: o nascimento da Cooperativa dos Jornalistas e do Coojornal, um jornal alternativo. Tanto uma quanto o outro incomodaram o regime militar e fizeram história.

Como seria o esperado, no vaivém de assuntos, naquele fim de semana, em Brasília, as lembranças da Cooperativa e do Coojornal dominaram a reunião. Ali surgiu a ideia de preservar a memória desta experiência inédita. Osmar Trindade, associado de primeira hora e um dos três presidentes da Cooperativa, ao longo de sua existência, ficou encarregado de capitanear o projeto. Missão que ele topou na hora.

Passados quatro anos dessa reunião na casa de Jandyra, a Janda, e Luiz Cláudio Cunha, e dois da morte de Osmar Trindade, a editora Libretos lança na quinta-feira (9), na Assembleia Legislativa, um livro com 33 das melhores reportagens e entrevistas publicadas pelo Coojornal e um documentário de uma hora com depoimentos de muitos dos associados. Também será aberta uma exposição com as 82 capas do jornal, sendo quatro de edições especiais. No dia seguinte (10), o documentário voltará a ser apresentado e será realizado um debate com ex-coojornalistas.

O projeto da Libretos contempla em parte o idealizado por Trindade, que previa contar a história da Cooperativa e do seu principal jornal, digitalizando todas as edições do Coojornal. A falta de recursos levou à decisão de, neste momento, focar apenas no jornal, com a edição do livro e do documentário. A digitalização ocorrerá numa segunda etapa, quando forem obtidos mais recursos.

Histórias inseparáveis

 

Luiz Claudio lembra ter dito, no encontro em torno de um bom churrasco, “como manda a praxe gaudéria”, que a memória da Cooperativa estava centrada 90% nos jornalistas Osmar Trindade, Elmar Bones da Costa, José Antônio Vieira da Cunha, Jorge Polydoro e Rosvita Saueressig Laux, “cinco figuras fundamentais” na vida da Cooperativa. Para Elmar, Vieira, Polydoro e Rosvita, é impossível falar do Coojornal sem falar da Cooperativa. Eles são irmãos siameses. Nasceram, sobreviveram e morreram juntos.


José Antônio Vieira da Cunha, ao lado da mulher Eliete: uma notícia sobre o Il Giionarle deu início a tudo - Foto: Marcelo Amaral/ Libretos

Tudo começou no início dos anos 70, quando jovens e inquietos jornalistas sentiram que começava a chegar ao fim a proposta de um novo jornalismo – mais ousado e inovador — feito pela Folha da Manhã, um dos três jornais da Companhia Jornalística Caldas Jr., editora também do Correio do Povo e da Folha da Tarde.

Pressões externas e internas se tornavam mais intensas. O momento político – todos acreditavam – logo sofreria uma mudança. Já havia militares trabalhando pela abertura. Jornais mais ousados, como a Folha da Manhã, e os alternativos, que pipocavam pelo país afora, poderiam ajudar a apressar o fim da ditadura.

Nas sacadas da Folha da Manhã, que davam para a Rua Caldas Jr., no Centro de Porto Alegre, repórteres e editores se reuniam para rápidos bate-papos sobre a vontade de trabalhar em um jornal em que a redação tivesse maior autonomia sobre o que era produzido e publicado. A conversa seguia nos bares, ao final de cada edição. Um dia, Vieira leu uma pequena notícia no Jornal da Tarde, de São Paulo, sobre o italiano Il Giornale, de Milão. Ali, falava-se de uma cooperativa de jornalistas. Vieira recortou a notícia e a apresentou aos colegas, perguntando-se se essa não seria a saída para os seus desejos e esperanças.

A conversa, então, prosperou. Saiu das sacadas da Folha da Manhã e das mesas de bares e restaurantes para a casa dos mais interessados. Uma das primeiras ocorreu na casa do próprio Vieira. O ano era 1974.

No dia 15 de março, o general Ernesto Geisel assumira a presidência da República, como 29° presidente do Brasil e quarto general-presidente da ditadura, sem contar a atuação da Junta Militar, em 1969. No Rio Grande do Sul, governava Euclides Triches, indicado pelo ex-presidente general Emílio Médici e confirmado pela Assembleia Legislativa, em 15 de março de 1971.

Longas, mas civilizadas negociações

 

Dos primeiros encontros mais organizados não chegaram a participar 10 pessoas. Atual diretor-geral do Grupo Amanhã, que edita, entre outras publicações, as revistas Amanhã e Aplauso, Jorge Polydoro cita como integrantes da primeira reunião na casa de Vieira, ele, o anfitrião, Elmar Bones da Costa, João Borges de Souza, Luiz Claudio Cunha, Rosvita Saueressig Laux e Osmar Trindade. A partir daí o grupo começa a se ampliar, com a adesão, por exemplo, dos fotógrafos JB Scalco, Ricardo Chaves (Kadão) e Jaqueline Joner.

A ideia de criar uma cooperativa seduziu o grupo, por três razões principais, afirma José Antônio Vieira da Cunha: a cooperativa é um organismo democrático, em que cada sócio tem direito a um voto, independente de quantas cotas possua; as decisões não são individuais, mas tomadas em assembleia e a cooperativa visa ao bem-estar e à prosperidade de seus integrantes. Decisão tomada, o segundo passo foi ir até o Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, que ditava a política do cooperativismo no Brasil, controlando e fiscalizando as cooperativas. A primeira informação recebida foi de que não existia cooperativa de trabalhadores intelectuais.

Depois de muitas idas e vindas e da direção do Incra ter se comprometido a estudar o caso, os jornalistas gaúchos receberam a informação de que não haveria qualquer obstáculo para a formação da cooperativa. Vieira lembra que as negociações foram “longas, mas civilizadas”. Eles sempre foram bem recebidos pela direção do Instituto. Para dar início ao processo de criação da Cooperativa, segundo o Incra, seria preciso divulgar amplamente a intenção entre a categoria. Foram impressos panfletos, distribuídos em todas as redações de Porto Alegre.

Leia a reportagem completa.

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