Não parei ainda para analisar se todas as mudanças no novo projeto de Código de Processo Penal, aprovadas pelo Senado nesta terça (7), são boas ou não, mas pelo menos uma delas vale nota: o fim da prisão especial provisória para quem tem diploma de curso superior.
A desigualdade social se manifesta de diversas formas, algumas mais tacanhas que outras. Essa, na minha opinião, é uma das formas mais descaradas, pois se duas pessoas cometem o mesmo crime, mas um delas estudou mais pode ficar em uma cela especial, separada dos demais presos. Se a outra tiver, digamos, até o ensino médio, terá que aguardar o julgamento com a massa, na xepa.
Ou seja, historicamente quem teve acesso à educação formal, que tendia a ser uma pessoa com mais recursos financeiros, desfruta de direitos sobre quem foi obrigado, em determinado momento da vida, a escolher entre estudar e trabalhar. Ou que, por vontade própria, simplesmente optou por não fazer uma faculdade. Não ter uma graduação faz de alguém melhor ou pior?
Em suma, é um medida que discrimina e que precisa ser revogada. O texto segue agora para a Câmara dos Deputados e depois à sanção ou veto presidencial. Fica mantida a prisão especial para o preso que precise de proteção ou que tenha a integridade pessoal em risco, como os ameaçados de morte.
(Particularmente, concordo com a opinião de alguns juristas que ressaltam que estamos tratando de prisão provisória. Ou seja, considerando que, antes do julgamento e de uma condenação, há a presunção da inocência, seria importante que o regime desses presos, todos eles, fosse diferenciado, do iletrado ao que tem pós-doutorado. Desse ponto de vista, não seria a concessão de um privilégio, mas a garantia de um direito.)
Ao mesmo tempo, mudou o perfil de quem tem curso superior no Brasil. Antes, o número de faculdades particulares era pequeno e as suas mensalidade altas, ao passo que os vestibulares das universidades públicas eram duros para quem estudou a vida inteira em escola pública e não tinha dinheiro para pagar um cursinho. Não que o acesso a tenha se universalizado, longe disso, mas ao mesmo tempo que aumentou o número de vagas em públicas federais (ainda que continuem bem insuficientes, diga-se de passagem), explodiu a quantidade de faculdades privadas, com mensalidadades acessíveis – e qualidade muitas vezes duvidosa. Mas o fato é que milhões do andar de baixo passaram a obter diplomas de nível superior. O que, na prática, acaba por tornar inócuo o benefício de cela especial. Quando muitos têm uma calça exclusiva, ela deixa de ser exclusiva e passa ser popular.
Isso significa que o andar de cima perdeu algo? Imagina! Mais simples e melhor continua sendo o método: “tenha um advogado caro e seja feliz”. Com isso, você pode cometer as maiores barbaridades, como matar a namorada ou desviar milhões, que dificilmente ficará preso aguardando julgamento. E, mesmo julgado, conseguirá o direito de ficar em casa até que todos os recursos sejam esgotados – o que pode levar mais tempo do que aquele que lhe resta de vida. Com um advogado caro, é possível até conseguir habeas corpus no Supremo Tribunal Federal de forma rápida e sem burocracias.
Por aqui, as coisas acontecem não do jeito que deveriam que acontecer, mas quando não são mais necessárias.
A desigualdade social se manifesta de diversas formas, algumas mais tacanhas que outras. Essa, na minha opinião, é uma das formas mais descaradas, pois se duas pessoas cometem o mesmo crime, mas um delas estudou mais pode ficar em uma cela especial, separada dos demais presos. Se a outra tiver, digamos, até o ensino médio, terá que aguardar o julgamento com a massa, na xepa.
Ou seja, historicamente quem teve acesso à educação formal, que tendia a ser uma pessoa com mais recursos financeiros, desfruta de direitos sobre quem foi obrigado, em determinado momento da vida, a escolher entre estudar e trabalhar. Ou que, por vontade própria, simplesmente optou por não fazer uma faculdade. Não ter uma graduação faz de alguém melhor ou pior?
Em suma, é um medida que discrimina e que precisa ser revogada. O texto segue agora para a Câmara dos Deputados e depois à sanção ou veto presidencial. Fica mantida a prisão especial para o preso que precise de proteção ou que tenha a integridade pessoal em risco, como os ameaçados de morte.
(Particularmente, concordo com a opinião de alguns juristas que ressaltam que estamos tratando de prisão provisória. Ou seja, considerando que, antes do julgamento e de uma condenação, há a presunção da inocência, seria importante que o regime desses presos, todos eles, fosse diferenciado, do iletrado ao que tem pós-doutorado. Desse ponto de vista, não seria a concessão de um privilégio, mas a garantia de um direito.)
Ao mesmo tempo, mudou o perfil de quem tem curso superior no Brasil. Antes, o número de faculdades particulares era pequeno e as suas mensalidade altas, ao passo que os vestibulares das universidades públicas eram duros para quem estudou a vida inteira em escola pública e não tinha dinheiro para pagar um cursinho. Não que o acesso a tenha se universalizado, longe disso, mas ao mesmo tempo que aumentou o número de vagas em públicas federais (ainda que continuem bem insuficientes, diga-se de passagem), explodiu a quantidade de faculdades privadas, com mensalidadades acessíveis – e qualidade muitas vezes duvidosa. Mas o fato é que milhões do andar de baixo passaram a obter diplomas de nível superior. O que, na prática, acaba por tornar inócuo o benefício de cela especial. Quando muitos têm uma calça exclusiva, ela deixa de ser exclusiva e passa ser popular.
Isso significa que o andar de cima perdeu algo? Imagina! Mais simples e melhor continua sendo o método: “tenha um advogado caro e seja feliz”. Com isso, você pode cometer as maiores barbaridades, como matar a namorada ou desviar milhões, que dificilmente ficará preso aguardando julgamento. E, mesmo julgado, conseguirá o direito de ficar em casa até que todos os recursos sejam esgotados – o que pode levar mais tempo do que aquele que lhe resta de vida. Com um advogado caro, é possível até conseguir habeas corpus no Supremo Tribunal Federal de forma rápida e sem burocracias.
Por aqui, as coisas acontecem não do jeito que deveriam que acontecer, mas quando não são mais necessárias.
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