segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

igreja não combina com religião(?)

Por que Igreja não combina com religião


Olha, não é muito difícil de explicar essa discrepância. Na verdade, difícil é entender como as coisas chegaram à situação atual. Por situação atual, refiro-me aos últimos séculos. Estou tratando, fique bem claro, de Igreja Católica.

Peguemos a síntese, a base da fé cristã. A história de Jesus que nos é contada dá conta de um homem pobre, nascido no meio do nada, filho de pais puros – ainda que um não fosse bem o pai, mas uma espécie de padrasto, e me refiro a José (aliás, esse parentesco me intrigava muito na infância, dado que concubinato não era aceito, mas José criava o filho da esposa com outro homem, que não era exatamente um homem… mas estou tergiversando) -, humilde, bom, generoso. Jesus, aquele judeu da história escrita naquele livro que chamam de Bíblia, defendia a igualdade entre os homens – não tanto entre as mulheres, mas pulemos essa parte por enquanto.

Corta. Passam uns 15 séculos.

Europa medieval. Católicos x muçulmanos. Invasões de lado a lado, disputa de impérios. Não é de agora que a Igreja, com sede em Roma, não gosta muito dessa história de dividir território. E aí falo literalmente. As cruzadas foram guerras “religiosas” com o objetivo econômico de dominar o espaço e conquistar poder.
1492. Os muçulmanos são expulsos de Granada, a última cidade espanhola que resistia. Ao mesmo tempo, católicos de fé chegam às Índias Ocidentais. A América.

Os índios ocupam estas terras. Ocupavam. Seres inferiores segundo a ótica europeia-cristã, são explorados, escravizados, trucidados, massacrados. Os europeus são mais iguais do que os índios na igualdade do Jesus do século XV.

Ao mesmo tempo, na Europa, mais iguais que as mulheres são os homens. Os católicos são mais iguais que os judeus. Bruxas, homossexuais, negros não são tão iguais assim. A igualdade de Jesus, 15 séculos depois, virou a igualdade do poder. Quem tem poder é igual a quem tem poder. Os outros são diferentes. A Inquisição durou centenas de anos, com mais intensidade em momentos diferentes em cada lugar.

Passam mais alguns séculos. Agora estamos na metade do século XX. 1964. No Brasil, o país que quase não tem mais índios – em Porto Alegre ainda os há, mendigando nas ruas e praças com suas crianças se arrastando pelos chãos -, alguns homens decidem que o presidente não pode mais governar. O motivo? É comunista. Famílias unem-se aos militares, chamados pelo poder de deus. A Igreja usa seu deus para amedrontar as famílias de bem contra o terror dos comedores de criancinhas. Nada pode ser pior do que um vermelho no poder, dizem.

As famílias acreditam. Não questionam. Não questionam. Não faz sentido. Mas não questionam.

Por que os comunistas são malvados? Eles defendem, afinal, que todos vivamos em igualdade. Não era igualdade o que pedia Jesus? O Jesus pobre quer ser igual, mas quando fica rico entende a diferença. Quer ser mais diferente. Ou mais igual?

Vinte séculos depois do humilde Jesus, filho de uma pobre Maria e de um desgraçado José, um fardado arrogante usa sua imagem para subir ao posto máximo da nação brasileira.

Nos 21 anos seguintes, homens perseguem homens. Os mais iguais torturam os menos iguais. Exilam. Seviciam. Matam.

Era isso que queria Jesus?

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Aviso aos leitores: antes que sejam feitas interpretações equivocadas, deixo claro minha posição. Apesar de não crer, respeito quem acredita na história de Jesus. Minha crítica se refere ao que a instituição Igreja fez da imagem dele. Jesus, se existiu, foi deturpado, transformado, usado para atender interesses de uns poucos detentores de poder que julgam poder julgar. Que selecionam – com que poder, meu deus? – quem merece mais e quem não merece nada. Que escolhem quem é bom e quem é mau, de acordo com seus critérios, que obedecem exclusivamente a seus interesses. Minha crítica não é, pois, a Jesus, mas ao que fizeram dele.

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