sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

quando teremos jornalismo verdade(?)

Al Jazeera Brasil

Jornalismo B

O artigo a seguir é uma colaboração especial de Rodolfo Mohr*

O título, infelizmente, não é uma notícia. A rede Al Jazeera do Catar não anunciou planos de uma versão brasileira e a entrada em português nas redes a cabo. O título se refere a minha pura vontade pessoal.
Criado em 1996, o canal de notícias 24 horas em árabe tornou-se mundialmente conhecido com sua cobertura independente e firme acerca das agressões imperialistas dos EUA e aliados no Afeganistão e no Iraque. Em Porto Alegre, camisetas foram vendidas com a inscrição “Al Jazeera: jornalismo verdade”, em apoio à rede contra os boicotes políticos e ataques físicos que a rede sofreu nas coberturas das guerras de 2001 e 2003. Porém, o maior capítulo da curta história da mais conhecida empresa jornalística do Catar veio no dia 11 de fevereiro de 2011.

Dez anos após ser alvo da fúria dos EUA quando denunciou os crimes, os horrores e as baixas de guerra – hoje, Assange é o jornalista perseguido pela Casa Branca – a Al Jazeera realiza uma verdadeira e consagradora cobertura da Revolução democrática no Egito.

Desde o dia 25 de janeiro quando iniciaram as jornadas de massivos protestos populares que culminaram com a queda do regime político comandado por Hosni Mubarak, a Al Jazeera em inglês se tornou lugar comum dos ávidos por notícias instantâneas das mobilizações.


O dia do anúncio da queda foi um prato cheio para jornalismo comparado. Estava acompanhando pela Al Jazeera em inglês na internet e na GloboNews pela TV a cabo. Quero registrar que considero a GloboNews um canal com jornalistas sérios e comprometidos com a notícia, com condições de aprofundar e apresentar muitos temas, em especial do noticiário internacional.

A diferença foi brutal. A Al Jazeera com repórteres na Praça Tahrir no Cairo, na Alexandria, com seus comentaristas espalhados pelo mundo árabe, comentando sobre as imagens ao vivo, ora da Praça Tahrir, ora em mosaico com outras cidades egípcias. A GloboNews interrompeu o Estúdio i para mostrar o depoimento de Suleiman, o vice-presidente que anunciou o fim da era Mubarak.

Após o curto pronunciamento o Egito ingressou numa das maiores festas populares de sua história milenar. Cogita-se que mais de 10 milhões de pessoas estavam nas ruas do país. A Al Jazeera silenciou seus jornalistas, ligou os microfones da Praça da Libertação e alternou a câmera enfocando toda a mobilização e os manifestações genuínas de alegria. Cerca de dez minutos em silêncio. As legendas descreviam a Revolução. A GloboNews, em clima de pêsame, friamente registrou. Os convidados do programa em comedidas falas comemoravam a vitória do povo e a queda do ditador. A palavra Revolução estava terminantemente proibida do vocabulário dos jornalistas da GloboNews.

A primeira jornalista que entra ao vivo da Praça Tahrir, aos prantos, chorando copiosamente, dizia estar “orgulhosa” de presenciar aqueles momentos. Na GloboNews, foi ao ar o perfil do ditador com a INACREDITÁVEL legenda: “Apesar do rótulo de ditador, Mubarak é indispensável para estabilidade do Oriente Médio”. Como assim, RÓTULO de ditador? Como assim É, logo após o anúncio da renúncia?
Adoraria que pudéssemos trocar de emissora.

*Rodolfo Mohr é estudante de jornalismo da UFRGS e autor do blog Rodomundo

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