Com sol ou chuva, em SP falta verdade ao governo e humanidade aos jornais
4 de novembro de 2014 | 07:31
Autor: Fernando Brito
No dia 31 de outubro, de manhã ainda, este blog comemorava a chegada das chuvas a São Paulo, até sob a desconfiança de alguns de seus leitores que, por lá, ainda sofriam com o calor e com o tempo seco.
E elas foram chegando, chegando, até desabarem com força, ontem, sobre uma cidade que está sofrendo todos os dias a escassez que ela traz.
Agora cedo, o dia clareando, fui procurar nos jornais de São Paulo a alegria das pessoas com a água que desabou como um presente do céu.
E, claro, também algum estrago que, vindo com esta força, ela possa ter causado.
Estes, até que não foram grandes para o volume de água. E estão fartamente descritos nos jornais.
Mas quanto ao bem que isso fez, nada, nem informação, nem emoção.
Só num jornal do Rio e no site da empresa de meteorologia Climatempo é possível saber que no trecho mais crítico do Sistema Cantareira, choveu ontem, até as 19:30, 59,2 milímetros, o que faz que os três primeiros dias de novembro tenham tido quase o mesmo de chuva que dois meses inteiros – setembro e outubro.
Se eles sabem, porque os grandes jornais de São Paulo não sabem?
Porque neles, há apenas uma burocrática afirmação de que “somente hoje (terça) será possível saber o impacto sobre os reservatórios”.
Burocrática e burra, porque qualquer técnico em hidrologia da Sabesp, se ouvido, poderia dizer que foi enorme. Aliás, que está sendo enorme, porque as águas continuam fluindo em volume muitíssimo superior àquele que se teve no outubro mais seco da história e assim permanecerão por muitos dias, além dos 10 em que, uns dias mais outros menos, continuará chovendo na região dos reservatórios.
Nem é preciso sair alguém na chuva, de lanterna, para ver a marca nas réguas de medição: há uma extensa rede de monitoramento remoto e em tempo real da vazão dos rios.
Claro que eu não posso, a centenas de quilômetros de São Paulo, dizer se forma três, quatro ou cinco bilhões de litros (quem sabe, mais? Tomara!) que fluíram para o Cantareira, ontem, porque a vazão se calcula com precisão na média de fluxo durante 24 horas. E vai ser alta, bem alta.
Mas seja qual tenha sido o volume, terá sido enorme em relação aos apenas 11,5 bilhões de litros com que o dia de ontem amanheceu nos reservatórios secos do sistema.
E, ao mesmo tempo, pequena, ainda muito pouco frente aos 700 ou 800 bilhões de litros a mais que se deveria ter acumulados ali, a esta época, em condições normais.
Nem números, nem sentimentos, porque não acho nas páginas da imprensa paulista as reações de alívio daqueles que estão penando com as torneiras secas, os baldes, a alteração em seus cotidianos já infernizados pela grande metrópole e seus outros problemas.
Os jornalistas, parece que esquecemos que a finalidade do nosso trabalho é informar sobre os fatos e mostrar seu impacto sobre a vida humana.
Passamos a reproduzir, apenas, o que dizem os outros, sem qualquer capacidade própria de análise. E análise da situação da água em São Paulo é algo em que as redações da grande imprensa em São Paulo deveriam ter acumulado experiência suficiente para fazer quase que automaticamente, a esta altura, depois de meses de falta d’água.
É por isso que reproduzem, sem questionamentos, a previsível fala de Geraldo Alckmin, vangloriando-se:
“Sempre colocamos que o período pior já vinha passando, que a cada dia estaríamos mais perto do período chuvoso. Nós ultrapassamos o inverno, já estamos no meio da primavera. As chuvas estão chegando e com uma boa reserva”.
Boa reserva? O nível dos reservatórios está 14 ou 15%, agora, abaixo do seu “zero” normal (sem bombeamento), as represas transformadas em lodaçais e as pessoas sem água durante dez, doze horas por dia – às vezes por dias a fio – e o governador diz isso, sem que haja uma observação sequer de qualquer pessoa da área que dirá o contrário, que as restrições ao consumo vão continuar verão adentro e o risco de colapso total do sistema permanece altíssimo e preocupante?
Novamente este blog advertiu, dias atrás, que viriam estas declarações semelhantes aos comerciais de quinquilharias na tevê: “seus problemas acabaram”.
A seca de jornalismo na imprensa paulista e de responsabilidade em seu governo continuam, cada vez mais graves.
Mesmo debaixo de um temporal.
PS. Tem gente que se iguala à turma do “quanto pior melhor” que torce pela seca em São Paulo. Aqui a gente fala do risco irresponsável que se corre de ter um desastre. E fala com preocupação, porque há gente lá sofrendo com isso. Milhões de pessoas, meu próprio filho entre elas. E torce para que a Natureza dê aos paulistas a água que seus governantes não souberam guardar.
PS2. Com os dados de vazão, vê-se que foi o primeiro dia, em muitos, que o nível do Cantareira não caiu, o que significa que entraram mais de 1,7 bilhão de litros, que foi a quantidade que saiu para o abastecimento e um pequeno saldo, de uns 400 milhões de litros, que não chega a alterar a estatística.O número, hoje, será melhor e seguirá assim nos próximos dias. Isso dá para ver como estamos longe de poder dizer que “seus problemas acabaram”, como faz o governo paulista.
No dia 31 de outubro, de manhã ainda, este blog comemorava a chegada das chuvas a São Paulo, até sob a desconfiança de alguns de seus leitores que, por lá, ainda sofriam com o calor e com o tempo seco.
E elas foram chegando, chegando, até desabarem com força, ontem, sobre uma cidade que está sofrendo todos os dias a escassez que ela traz.
Agora cedo, o dia clareando, fui procurar nos jornais de São Paulo a alegria das pessoas com a água que desabou como um presente do céu.
E, claro, também algum estrago que, vindo com esta força, ela possa ter causado.
Estes, até que não foram grandes para o volume de água. E estão fartamente descritos nos jornais.
Mas quanto ao bem que isso fez, nada, nem informação, nem emoção.
Só num jornal do Rio e no site da empresa de meteorologia Climatempo é possível saber que no trecho mais crítico do Sistema Cantareira, choveu ontem, até as 19:30, 59,2 milímetros, o que faz que os três primeiros dias de novembro tenham tido quase o mesmo de chuva que dois meses inteiros – setembro e outubro.
Se eles sabem, porque os grandes jornais de São Paulo não sabem?
Porque neles, há apenas uma burocrática afirmação de que “somente hoje (terça) será possível saber o impacto sobre os reservatórios”.
Burocrática e burra, porque qualquer técnico em hidrologia da Sabesp, se ouvido, poderia dizer que foi enorme. Aliás, que está sendo enorme, porque as águas continuam fluindo em volume muitíssimo superior àquele que se teve no outubro mais seco da história e assim permanecerão por muitos dias, além dos 10 em que, uns dias mais outros menos, continuará chovendo na região dos reservatórios.
Nem é preciso sair alguém na chuva, de lanterna, para ver a marca nas réguas de medição: há uma extensa rede de monitoramento remoto e em tempo real da vazão dos rios.
Claro que eu não posso, a centenas de quilômetros de São Paulo, dizer se forma três, quatro ou cinco bilhões de litros (quem sabe, mais? Tomara!) que fluíram para o Cantareira, ontem, porque a vazão se calcula com precisão na média de fluxo durante 24 horas. E vai ser alta, bem alta.
Mas seja qual tenha sido o volume, terá sido enorme em relação aos apenas 11,5 bilhões de litros com que o dia de ontem amanheceu nos reservatórios secos do sistema.
E, ao mesmo tempo, pequena, ainda muito pouco frente aos 700 ou 800 bilhões de litros a mais que se deveria ter acumulados ali, a esta época, em condições normais.
Nem números, nem sentimentos, porque não acho nas páginas da imprensa paulista as reações de alívio daqueles que estão penando com as torneiras secas, os baldes, a alteração em seus cotidianos já infernizados pela grande metrópole e seus outros problemas.
Os jornalistas, parece que esquecemos que a finalidade do nosso trabalho é informar sobre os fatos e mostrar seu impacto sobre a vida humana.
Passamos a reproduzir, apenas, o que dizem os outros, sem qualquer capacidade própria de análise. E análise da situação da água em São Paulo é algo em que as redações da grande imprensa em São Paulo deveriam ter acumulado experiência suficiente para fazer quase que automaticamente, a esta altura, depois de meses de falta d’água.
É por isso que reproduzem, sem questionamentos, a previsível fala de Geraldo Alckmin, vangloriando-se:
“Sempre colocamos que o período pior já vinha passando, que a cada dia estaríamos mais perto do período chuvoso. Nós ultrapassamos o inverno, já estamos no meio da primavera. As chuvas estão chegando e com uma boa reserva”.
Boa reserva? O nível dos reservatórios está 14 ou 15%, agora, abaixo do seu “zero” normal (sem bombeamento), as represas transformadas em lodaçais e as pessoas sem água durante dez, doze horas por dia – às vezes por dias a fio – e o governador diz isso, sem que haja uma observação sequer de qualquer pessoa da área que dirá o contrário, que as restrições ao consumo vão continuar verão adentro e o risco de colapso total do sistema permanece altíssimo e preocupante?
Novamente este blog advertiu, dias atrás, que viriam estas declarações semelhantes aos comerciais de quinquilharias na tevê: “seus problemas acabaram”.
A seca de jornalismo na imprensa paulista e de responsabilidade em seu governo continuam, cada vez mais graves.
Mesmo debaixo de um temporal.
PS. Tem gente que se iguala à turma do “quanto pior melhor” que torce pela seca em São Paulo. Aqui a gente fala do risco irresponsável que se corre de ter um desastre. E fala com preocupação, porque há gente lá sofrendo com isso. Milhões de pessoas, meu próprio filho entre elas. E torce para que a Natureza dê aos paulistas a água que seus governantes não souberam guardar.
PS2. Com os dados de vazão, vê-se que foi o primeiro dia, em muitos, que o nível do Cantareira não caiu, o que significa que entraram mais de 1,7 bilhão de litros, que foi a quantidade que saiu para o abastecimento e um pequeno saldo, de uns 400 milhões de litros, que não chega a alterar a estatística.O número, hoje, será melhor e seguirá assim nos próximos dias. Isso dá para ver como estamos longe de poder dizer que “seus problemas acabaram”, como faz o governo paulista.
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