Sentado em seu escritório de defensor privado, aquele Algemadotira procura algo para desviar sua atenção. Ela está permanentemente fixa. Não tem ninguém para desencaminhá-lo, levá-lo a passear. Vive de conter a vontade de sair correndo. Não existem milagres. Confiar desconfiado. Quanta amargura. Logo ele, rico de tanto trabalho. Mundo mau esse que o sustenta. Ele não se sente mais apaixonado. Somente outro jeito de ganhar a alimentação folgada. Fica ali, sentado, com o dedo no nariz, desalinhado da própria vontade de ferro, Dane-se o mundo. Diz, enquanto acaricia minhas pernas. Tenho pernas bonitas.
Passado um tempo de cansar a espera, a dona Cogitabunda se entra, tento me recompor, Dr Algemadotira, eles estão muito ansiosos, Eles quem, O pessoal que está esperando, O que foi, Parece que o rapaz matou um sujeito, Tá, manda entrar, por agora, resolvo esse indivíduo duvidoso. O fastio já não é apenas na aparência vem junto com a falta da vontade de agradar, ser gentil. Está em estação de ficar afronhado, até restar no feitio da fronha. Amarrotado.
É tudo igual. As mesmas respostas dão nas mesmas perguntas, O que foi, meu filho, Esse meu amigo, que eu matei, tomou todas as cervejas comigo, fechamos o boteco, doutor, e depois me estranhou, O que ele fez, Puxou da faca e partiu pra cima, De quem, De mim, O que você fez, Tirei a faca dele e dei uma facada, E..., Morreu, mas eu to com a faca aqui, Não, você não está com a faca, To sim, doutor, quer ver, Nãoooo, você não está entendendo, O que doutor, Você não está com a faca, Mas eu to sim, doutor, Nãoooooooo, essa faca pelo que você sabe está no fundo do rio, Mas como, Você vai pegá-la, longe de mim, embrulhar numa pedra e jogá-la no rio, Mas assim ninguém encontra, Isso, você entendeu, já iniciamos a sua defesa, Sim, doutor. Outro caso resolvido, Dona Cogitabunda, O que foi Dr Algemadotira, Esse rapaz já está de saída, amanhã ele retorna, com uma cara mais mansa e um olhar triste, Obrigado, doutor, A justiça precisa levar vantagem, É verdade, A verdade nada tem com isso, ela é contingente, O que doutor, Nada, esquece rapaz.
De novo, na solidão, sem entusiasmo. Noto que vem de muito a perder as forças. Precisa ainda ler aqueles depoimentos todos, Cogitabunda, Sim, senhor Algemadotira, Menina, vá para casa, por hoje, me fico no isolamento do falatório escrito, O que estás a quer achar, Acolhimento e considerações para o possível de não ter acontecido, Estás a querer virar do avesso o já declarado, Isso mesmo, Boa noite, então, Boa noite. Mesmo eu, daqui, sinto a dor do desperdício, toda oferecida, mas mandada embora, Vá descansar. Também me apronto, para uma noite de trabalhos.
Já se faz um bom tempo de anos que venho cogitando de mandar pregar, em algum lugar seguro, esse tal Algemadotira, mas ele sempre escapa pelas frestas dos meus dedos. Tenho dedos muito magros. O Algemadotira, que me conhece pelas intimidades, tem todo tempo para ensaiar o tal escapamento pelas rachadelas. Treina e exercita e adestra, busca a perfeição, está tudo escrito, basta decorar, Por mim, esse ficaria por muitos anos trancado, mas isso não depende dos meus desejos. As palavras jogadas em minha sala não buscam a verdade. Eu, não acredito na verdade, só em mim. Esse tira algemas, também, só crê em si. Eu tenho que conviver com as razões alheias, enquanto o mundo se perde dos amigos.
O Algemadotira copia para a memória o que lê e volta a recitar inúmeras vezes o lido. Está confiante, mas já aprendeu a não deixar nada ao acaso. Todos os pontos e todas as vírgulas precisam estar nos seus lugares. Pensa que a minha saúde emocional depende da sua correta orientação. Aprecia me ver enlouquecida. Sem o uso da razão.
Enquanto rele aquele ajuntado de folhas roça levemente os dedos em minhas pernas, mecanicamente, me mantém com os olhos vendados. Gosta de me ostentar em sua mesa. Em uma das minhas mãos conservo erguida a balança, e na outra a minha inseparável espada. Meu equilíbrio depende da minha força relutante ao seu fascínio. Anima-se em me seduzir. A bem da verdade processual, a mim, é difícil lhe resistir. Enganoso de aparência. O cabritismo da sua língua provoca a minha sensualidade. Exerce o tráfico das influências da carne, aceito o risco. Seduz minhas partes valendo-se da minha inexperiência com carnalidades. Sou pura de coração, mas a carne enraizada me corrompe.
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