Para Tarso Genro, OAB foi conivente com a situação do Presídio Central nos governos anteriores
Somos anadando
Não é fácil entender determinadas coisas. Por exemplo, por que a questão do Presídio Central só foi parar no centro das atenções nas últimas semanas. Será que ninguém tinha notado que a situação lá dentro estava insustentável? Ou os 2,6 mil presos além da sua capacidade foram incorporados nos últimos poucos meses?
Tipo a Ordem dos Advogados do Brasil, que parece não ter tomado conhecimento da existência de um presídio em situação de total desumanidade no Rio Grande do Sul, já que decidiu só agora que tinha que fazer alguma coisa. Afinal, como diz a Zero Hora, só “medidas drásticas” podem resolver o problema. Problema que, pelo jeito, surgiu do nada. Pois a OAB vai, então tomar medidas drásticas, como denunciar o governador na Corte Internacional de Direitos Humanos.
(Perguntinha de quem não entende muito das coisas: a gente não denuncia alguém quando essa pessoa fez alguma coisa muito errada, tipo deixar um presídio chegar ao dobro da sua capacidade sem as mínimas condições de sobrevivência digna lá dentro? Por acaso tudo isso aconteceu em 15 meses? E só tem um responsável?)
O que mais me incomoda, no entanto, é ver ninguém falar nada, como se discordar desse povo fosse crime. Pois o governador decidiu retrucar. E a gente, então, decide divulgar. Foi no programa do Sérgio Zambiasi, o Comando Maior, na rádio Farroupilha, nesta sexta-feira (21). Segue um trecho.
Sérgio Zambiasi – Como o senhor vê a questão do presídio central?Tarso Genro – Há um histórico. A minha relação com a questão do Presídio Central começa quando era ministro da Justiça. Na ocasião destacamos dois presídios como as vergonhas nacionais, o Central e o Aníbal Bruno, em Pernambuco. Eu destaquei R$ 20 milhões do orçamento para repassar R$ 10 milhões para o RS iniciar a reforma do Central e R$ 10 milhões para Pernambuco, com contrapartida de 100% dos estados. Ou seja, cada estado investiria R$ 10 milhões, totalizando R$ 20 milhões cada presídio. Eu tive sucesso no Aníbal Bruno, que sofreu uma das reformas mais importantes. Aqui eu não consegui repassar o dinheiro porque não houve uma reação, uma apresentação de projetos. Eu não sei o que houve, se foi um problema técnico do governo do estado ou desgosto político do governo anterior. O fato é que não pude passar o dinheiro para o RS, então o presídio ficou paralisado, como já estava desde a década de 90.Agora nós assumimos e começamos a tocar duas obras importantes como a do esgoto e a da cozinha, mas com todas as dificuldades que vocês sabem, de entrar no Presídio Central, de fazer licitações, fazer o projeto e ir tocando as obras do presídio que estavam em andamento no governo anterior, mas que tiveram de parar por problemas técnicos. Problemas inclusive de relação com os financiamentos que vinham do Ministério da Justiça.Tudo que está sendo colocado pelo Presídio Central é verdadeiro e não é novo. O que me estranha é que a Ordem dos Advogados do Brasil, que esteve omissa durante oito anos, tenha tomado uma atitude escandalosa agora, fazendo investigações, verificações, como se fosse uma grande novidade. Atitude esta que ela não tomou em nenhuma oportunidade anteriormente. Que eu saiba, é a primeira vez e com holofotes para fazer escândalos. Inclusive, quando tentei passar os recursos para cá, a direção da OAB, que era muito vinculada ao governo que apoiava anteriormente, não tomou nenhuma atitude, nenhum conhecimento a respeito. Eu saúdo a iniciativa da OAB, mas só lamento que não tenha sido feito antes.Nós temos condições de oferecer todos os dados, nós temos um relatório, que vamos publicar amanhã, inclusive com informações de como está o Presídio Central, do que foi feito nos últimos oito anos. Nosso objetivo é reduzir pela metade a ocupação dos presídios nos próximos quatro meses.SZ – A intenção do governo é reduzir para a metade a população, aí consegue fazer a obra e mantém certa segurança?TG – É muito difícil sofrer reforma substancial com a superpopulação que nós recebemos. Então nós estamos empenhados, e é uma questão de humanismo. Mas me causa certa indignação a forma como está sendo divulgado, como se a inércia fosse do nosso governo, quando é exatamente o contrário. Nós é que estamos interferindo na questão do Presídio Central para melhorar e para investir lá, coisa que não foi feita nos últimos oito anos.SZ – Este anúncio é talvez o melhor alento.TG – Atualmente o Presídio Central – veja bem como nós o recebemos – tem 2,6 mil presos acima da capacidade normal. É um campo de concentração, é uma coisa horrorosa. Então nós estamos tomando providências e estamos fazendo intervenção pesada. Vamos investir. E quando tivermos a metade da lotação do presídio vamos discutir que atitude tomar, se ele vai ser utilizado como presídio. Nós vamos fazer um negócio e fazer render. Fazer outra estrutura prisional em outro local. Na época do governo Britto, foi anunciado em página inteira que o governo tinha determinado que se vendesse a área do presídio, e nada foi feito.SZ – Há a possibilidade de fechar o PC?TG – Nós agora vamos construir o complexo de Canoas. Já estamos fazendo recursos e inclusive estamos pedindo recursos para fazer uma contratação em regime de urgência e discutindo com o Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público para agregar mais vagas no sistema prisional. O PC é um símbolo de desumanidade e tragédia herdado por nós, e agora existe um movimento político dirigido pela OAB para nos outorgar a responsabilidade. A OAB foi omissa nos últimos oito anos em relação a qualquer questão relacionada ao Presídio Central.
No fim, o governador disse ainda que a decisão final sobre o que fazer com o Presídio Central vai acontecer depois, quando a população já estiver pela metade. “A primeira coisa é reduzir as condições de desumanidade”, disse. A meta da Secretaria de Segurança Pública, segundo ele, é abrir 1,6 mil vagas para depois construir o complexo de Canoas, que já está sendo negociado com o prefeito Jairo Jorge.