Uma falsa e perigosa polêmica
Cris Rodrigues no Somos Andando
No dia do aniversário do golpe que mergulhou o Brasil em mais de 20 anos de ditadura, a Zero Hora publicaum artigo (“A dita dura brasileira”) de um coronel que defende os responsáveis por toda a dor causada naquele período. Não vou entrar no mérito do artigo, mas de sua publicação. Generais e coronéis de pijamas existem uns quantos, e alguns deles não se importam de assumir o ridículo de defender uma ditadura que causou mortes, torturas, desaparecimentos.
Antes que surjam os argumentos de que o jornal gaúcho estava apenas abrindo espaço para o contraditório, antecipo-me a contestá-los. As mortes, as torturas, os desaparecimentos, embora não tenham sido julgados, são incontestáveis. Abrir espaço para que alguém, o coronel Sparta, defenda o regime de exceção que causou-os é como ceder a página a um assassino em série para que defendesse seus atos. Não para que se dissesse inocente, mas para que justificasse as mortes, dizendo-as necessárias e apontando consequências positivas em tirar vidas.
O jornal diz que prega a democracia e não se furta de criticar enfaticamente cada vez que se faz qualquer movimento que possa ser interpretado como censura (até os que não o são). Pois esse jornal publica um artigo de um coronel que justifica e defende um período em que os jornais não podiam contar os fatos a seus leitores, em que a censura era regra. Fica por conta do leitor avaliar a contradição.
Vão dizer que queriam causar polêmica, suponho. Então quero que me expliquem onde está a polêmica, o que querem discutir. Querem que apareçam pessoas dizendo que os mortos da ditadura não estão mortos? Ou, pior, que estão mortos porque mereciam? Essa polêmica é falsa, porque os fatos estão dados. Permitir esse “debate” é incentivar que não investiguemos a nossa história e proporcionar uma reavaliação do passado que pode, em última análise, reavivá-lo.
Sei bem que a Zero Hora, como a maioria dos jornais, não necessariamente concorda com as opiniões publicadas em suas colunas. E isso é democracia, concordo (embora ache importante observarmos que dificilmente o jornal publica opinião de representantes de movimentos sociais, por exemplo, e não seja tão democrático assim). Mas quando isso significa publicar uma opinião defendendo a ditadura, isso extrapola os limites da democracia. A defesa da ausência de democracia não tem como ser democrática.
Há duas opções. A primeira é a de que jornal acredita que houve um golpe militar e que milhares de pessoas desapareceram, morreram e sofreram nas mãos de seus coronéis e generais e assume que, sabedora disso, aceitou publicar um artigo que defende esses atos – insisto, é tortura e assassinato. Ou então ele publicou porque não acredita que existiu o tal regime de exceção, e aí, bom, aí nem preciso continuar a comentar.
Não ficou claro? Partamos para uma comparação. Parece admissível que qualquer veículo europeu publique uma defesa do holocausto? Não, e é por isso que eles não o fazem. As proporções podem não ser as mesmas, mas a crueldade de uma época e de outra não é tão diferente. Tanto o holocausto quanto a ditadura militar brasileira mataram sem julgar, torturaram, sumiram com pessoas e fizeram muitas outras saírem forçadamente de seu país. Nenhum dos dois é aceitável, e trata-los como assunto passível de debate é justificá-los.
Vão dizer que queriam causar polêmica, suponho. Então quero que me expliquem onde está a polêmica, o que querem discutir. Querem que apareçam pessoas dizendo que os mortos da ditadura não estão mortos? Ou, pior, que estão mortos porque mereciam? Essa polêmica é falsa, porque os fatos estão dados. Permitir esse “debate” é incentivar que não investiguemos a nossa história e proporcionar uma reavaliação do passado que pode, em última análise, reavivá-lo.
Sei bem que a Zero Hora, como a maioria dos jornais, não necessariamente concorda com as opiniões publicadas em suas colunas. E isso é democracia, concordo (embora ache importante observarmos que dificilmente o jornal publica opinião de representantes de movimentos sociais, por exemplo, e não seja tão democrático assim). Mas quando isso significa publicar uma opinião defendendo a ditadura, isso extrapola os limites da democracia. A defesa da ausência de democracia não tem como ser democrática.
Há duas opções. A primeira é a de que jornal acredita que houve um golpe militar e que milhares de pessoas desapareceram, morreram e sofreram nas mãos de seus coronéis e generais e assume que, sabedora disso, aceitou publicar um artigo que defende esses atos – insisto, é tortura e assassinato. Ou então ele publicou porque não acredita que existiu o tal regime de exceção, e aí, bom, aí nem preciso continuar a comentar.
Não ficou claro? Partamos para uma comparação. Parece admissível que qualquer veículo europeu publique uma defesa do holocausto? Não, e é por isso que eles não o fazem. As proporções podem não ser as mesmas, mas a crueldade de uma época e de outra não é tão diferente. Tanto o holocausto quanto a ditadura militar brasileira mataram sem julgar, torturaram, sumiram com pessoas e fizeram muitas outras saírem forçadamente de seu país. Nenhum dos dois é aceitável, e trata-los como assunto passível de debate é justificá-los.
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