segunda-feira, 25 de junho de 2012

“Nos submetemos ao impeachment e aceitamos o veredito para evitar derramamento de sangue”


“Estamos saindo às ruas e conversando com os cidadãos”, diz Lugo ao Página 12

Lugo mantém reuniões com integrantes do antigo ministério | Foto: Presidência do Paraguai
Por Martín Granovsky, do Página 12
O presidente deposto do Paraguai, Fernando Lugo, não pretende cruzar os braços após sua derrubada do poder no país. Oficialmente, Federico Franco, ex-vice de Lugo, está no comando do país, mas, extraoficialmente, o agora ex-presidente vem mantendo articulações locais e internacionais para tentar retornar ao palácio presidencial.
Em entrevista concedida na noite de domingo (24) ao jornal argentino Página 12, Lugo conta que está conversando com cidadãos, com líderes sindicais e políticos, e que ainda mantém unido o primeiro escalão de seu governo. O ex-presidente também justifica a reação pacífica que adotou ao que qualifica como “golpe de Estado parlamentar”. “Nos submetemos ao impeachment e aceitamos o veredito para evitar derramamento de sangue”, explicou.
Página 12 – Franco diz que o senhor é o responsável por qualquer represália externa que o Paraguai possa receber. Que só o senhor pode evitar os conflitos internacionais.
Fernando Lugo – Cospem em você e ao mesmo tempo dizem que você é bonito. Não são castigos ao Paraguai. Estamos diante de um grande movimento de solidariedade internacional no qual participa o teu país também. A Argentina é um país irmão, um vizinho muito próximo que conhece muito bem a realidade paraguaia.
Página 12 – Retirou o embaixador Rafael Romá.
Lugo – A Argentina fez o que, dentro de sua soberania, considerou que seria útil para a liberdade e a soberania de um país que quer a democracia como o Paraguai.
Chanceler brasileiro Antonio Patriota (esquerda) esteve no Paraguai para apoiar Lugo | Foto: Fernando Lugo/Flickr
Página 12 – E se a solidariedade ao Sr. se converter em problemas para os cidadãos, como o senhor reagirá?
Lugo – Lamentavelmente, muitos inocentes podem sofrer as consequências. Eu quero o melhor para o Paraguai e por isso repudio o atual regime.
Página 12 – Na madrugada de domingo, em frente à sede da televisão pública, o senhor defendeu uma resistência pacífica. Essa será a tática?
Lugo – Sim, já começamos a resistência pacífica e um não reconhecimento da Presidência que se instalou depois do golpe de Estado parlamentar. E já é possível ver as manifestações de cidadãs e cidadãos, elas existem e são crescentes e pacíficas. Se expressam contra o que o Parlamento decidiu naquela sexta-feira negra. Também faremos uma reunião de gabinete.
Página 12 – Quando?
Lugo – Às 6h (desta segunda-feira, 25). Todos os meus colaboradores que integravam o gabinete ministerial quando estávamos no governo irão participar.
Página 12 – Quando o senhor se despediu dos chanceleres da Unasul, disse a eles que voltaria ao seu trabalho político nas bases.
Lugo – E já começamos a fazer isso. Vamos unir forças com os movimentos sociais e os sindicatos.
Página 12 – Sempre dentro da lógica da não violência?
Lugo – Sim, sempre.
Página 12 – Por isso na sexta, quando o senhor foi deposto, teve uma atitude pacífica?
Lugo – Exatamente. Nos submetemos ao impeachment e aceitamos o veredito para evitar derramamento de sangue. Somos contra todo o tipo de violência e neste dia havia a possibilidade de violência e repressão. Hoje, já com o espírito sereno, as manifestações da cidadania são exemplares. É o que se pode ver nas ruas ou nas transmissões do Canal 13.
Página 12 – Essa forma de ação política será também adotada no interior do Paraguai?
Lugo – Sim e estamos tranquilos para essa tarefa. É por isso que nossa atitude na sexta-feira foi muito bem pensada. Há muita violência no Paraguai. Naquela sexta-feira, os mercadores da morte estavam rondando. O impeachment foi injusto, irracional e sem argumentos, mas precisávamos reagir da forma como reagimos. Era o melhor.
Ex-presidente participará da reunião de cúpula do Mercosul nesta semana | Foto: PR/PY
Página 12 – O dinamismo da suas ações aumentará?
Lugo – Estamos saindo às ruas e conversando com os cidadãos. Hoje mantivemos uma série de reuniões com líderes sociais e políticos. O repúdio está crescendo, estou certo disso. Haverá uma consolidação do repúdio contra a Presidência que surgiu após a minha destituição.
Página 12 – Franco insiste em dizer que o Congresso apenas aplicou o artigo da Constituição que estipula os procedimentos do impeachment.
Lugo – É interessante destacar o que disse o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. A ferramenta do impeachment é válida do ponto de vista jurídico e constitucional, mas os congressistas exageraram na maneira como agiram.
Página 12 – Os congressistas poderiam dizer que votaram com maiorias qualificadas.
Lugo – Foi um simples acordo de cúpulas feito entre os dirigentes dos três partidos tradicionais.
Página 12 – Na sua primeira aparição pública após a destituição, o senhor disse que havia setores políticos vinculados ao narcotráfico. A quem o senhor se referia?
Lugo – Há muitos parlamentares acusados de ter uma grande participação em negócios ilícitos. O narcotráfico está presente em alguns setores da política. Há investigações que foram publicadas e denunciadas.
Tradução de Samir Oliveira.

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