Faltou Aécio Neves na lista da “Folha”: o moralismo seletivo ainda é a regra
por Rodrigo Vianna
Nas últimas semanas, militantes de esquerda, blogueiros, lideranças políticas e sindicais concentraram-se num (saudável) processo de crítica ao governo Dilma e às atitudes recentes da direção do PT. Aqui no Escrevinhador, procuramos alimentar esse debate – o que gerou reação irada de alguns leitores que preferiam a “defesa firme” do governo. Recuso-me a seguir por esse caminho do “apoio incondicional”, e lembro que a crítica dura pode ser uma ótima forma de colaborar com o país – ainda que ninguém tenha me pedido colaboração alguma.
De todo jeito, a crítica ao governo não significa esquecer quem está do outro lado. E um bom exemplo é a reportagem de capa na “Folha” desse domingo. Em letras garrafais, o jornal anuncia a lista de congressistas que são donos de rádios e TVs, ou que mantêm parentes na direção das emissoras.
Trata-se de assunto importante, sem dúvida. Mas é curioso que a “Folha” tenha “esquecido” um nome na lista!
Ora, há pouco mais de um mês o Brasil ficou sabendo que Aécio Neves, o impulsivo e notívago líder da oposição, é dono de uma rádio em Minas. A própria “Folha” fez matéria sobre o fato. Descobriu-se que o carro conduzido por Aécio, quando ele foi parado numa blitz da lei seca no Rio, estava em nome da tal rádio.
E descobriu-se, ainda, que a rádio de Aecim é dona de uma estranha frota de carros de luxo. A oposição ao PSDB em Minas desconfia de repasse de recursos públicos para a rádio, e tenta abrir uma CPI. Quem não se lembra pode ler reportagem da “Folha” aqui.
Agora, a “Folha” traz uma lista enorme de deputados e senadores do chamado “baixo clero”, donos de rádios e TVs. Ótimo!
Mas e o Aécio? Cadê? Por que não está na lista?
O jornal pode se eximir, dizendo que “apenas” reproduziu a lista – que está sendo preparada pelo próprio governo federal, numa tentativa de moralizar o setor. Ora, nesse caso a “Folha” é que devia lembrar o leitor sobre a existência da rádio de Aécio, estranhando que o nome dele não esteja na tal lista! Não se trata de qualquer um: é o líder da oposição!
Outra observação: a “Folha” não deu destaque para o fato de, depois de 8 anos de governo Lula, não haver nenhum parlamentar do PT dono de rádio ou TV! Imagine se houvesse um? Unzinho só? Viraria manchete.
Mas Aécio (que tem rádio), esse passa longe da reportagem de domingo no jornal de maior circulação do país.
O moralismo seletivo continua a ser a regra na “Folha”, na “Veja”, no ”Estadão”, em “O Globo”.
Claro que os jornais cumprem seu papel ao divulgar o estranho enriquecimento de Palocci. Não há do que reclamar no caso isolado. Mas salta aos olhos que não se faça o mesmo com a filha do Serra! Quem pagou a casa onde vive a família Serra no Alto de Pinheiros, em São Paulo? Por que Verônica Serra multiplicou o patrimônio de sua empresa em 50 vezes, como se lê aqui?
Não faço aqui qualquer acusação contra Verônica. Mas não é curioso esse moralismo seletivo que poupa a família Serra e a rádio do Aécio, enquanto tenta emparedar o Palocci?
Por essas e outras (quem não se lembra da “ficha falsa” de Dilma na “Folha”, do pé na bunda de Lula na “Veja”, e das armações de Ali Kamel – o jornalista da bolinha de papel - na Globo?), todo mundo que acompanha as comunicações no Brasil estranhou quando Dilma tentou fazer de conta que isso tudo não existe, e adotou a tática de “normalizar” relações com a velha mídia: foi à festa da “Folha”, fez omelete na Globo e mandou recados de que “o clima precisava melhorar de parte a parte”.
Dilma errou feio (também) nessa estratégia. Como diria Mané Garrincha, faltou combinar com os russos!
Sob comando de Otavinho Frias, Ali Kamel (o jornalista) e da turma barra pesada da Abril, os russos seguem a adotar a tática de sempre: tentaram “matar” Dilma na capa de “Epoca” essa semana, livraram a cara de Aécio na capa da “Folha”, e seguiram a bater em Palocci.
O governo deve ter apreendido algo nesse episódio. Os russos continuam sendo os russos. Palocci, aliás, é daqueles que se dão bem com os russos. Dilma poderia aproveitar a crise, mandar Palocci tomar chopp no Pinguin em Ribeirão Preto, e voltar a tratar os russos como eles são. Pra isso, seria preciso adotar outro tom.
A Dilma precisa ser aquele Dilma do primeiro debate do segundo turno. A Dilma que não ouve marqueteiros nem Paloccis - e faz a boa e velha política.
Do contrário, ela continuará sendo “morta” toda semana pela “Epoca”, enquanto a turma do Kamel e do Otavinho seguirá a pavimentar o caminho para que Aécio (ou outro da turma dele) avance em 2014.
Nada mudou quanto a isso. A não ser o fato de que a direção do PT parece ter-se encantado com os rapapés do poder e esquecido de um detalhe: mesmo moderadíssimo, mesmo cheio de ministro consultores, o PT e o lulismo não frenquentam as reuniões do Country Clube no Rio e nem tomam whisky com os ricaços no Clube Harmonia em São Paulo. Por isso, Palocci e outros da mesma cêpa são vistos pela elite como arrivistas, como gente que se lambuza porque nunca antes comeu mel.
Bem que Dilma poderia aproveitar a deixa pra se livrar da turma que está toda lambuzada.
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