Momento Yeda
No primeiro debate entre os presidenciáveis, José Serra teve o seu momento Yeda (*). Perguntado por Plínio de Arruda Sampaio sobre a campanha pelo plebiscito popular para o estabelecimento de limites às grandes propriedades, o candidato tucano disse que mexer com os donos de áreas imensas seria “arrumar sarna pra se coçar”. O argumento, débil por fugir do mérito, seria de que o Brasil já tem muitas áreas desapropriadas.
Mas à sofrível primeira resposta, seguiu-se outra pérola da ideologia tucana. “No Chile, país que fez a primeira reforma agrária nos anos 60, era considerado latifúndio qualquer propriedade acima de 80 hectares. Evidentemente, isso no Brasil é uma coisa de chácara de fim de semana, praticamente. É uma propriedade muito pequena,” disse Serra.
Ora, que um candidato à Presidência da República não tenha coragem de enfrentar o latifúndio (como, aliás, muito bem sintetizou o candidato Plínio ao comentar a resposta de Serra) já é uma lástima; mas que ele desconheça que a maioria das áreas onde se pratica agricultura familiar no Brasil é inferior a 50 hectares, aí já é imperdoável.
Tomando-se o Rio Grande do Sul como exemplo, cerca de 90% das propriedades de agricultura familiar são inferiores a 50 hectares. Mesmo assim, é o Estado do País que mais produz comida. Mas para que possa ostentar essa excelência produtiva, as propriedades são tomadas por lavouras de soja, milho, feijão, arroz, hortaliças, frutas, trigo e abrigam animais como suínos, aves e gado. Tudo isso, impõe aos agricultores familiares uma rotina duríssima de trabalho que, normalmente, inicia antes do dia amanhecer e só encerra depois que todos os animais foram tratados e o leite tirado, ou seja, depois que o sol se foi.
E quem conhece a agricultura familiar, sabe que não se pode deixar para segunda-feira, o leite que deve ser tirado no domingo. Seria o caso de dizer, então, ao candidato José Serra, que no Brasil de verdade, propriedades de até 80 hectares não são chácaras de final de semana onde os bacanas descansam das rotinas estressantes dos escritórios; são, isto sim, territórios onde se trabalha incansável e incessantemente.
Seria, ainda, oportuno, lembrar a José Serra que com 80 hectares, uma propriedade não é “muito pequena” como ele afirma. É área suficiente para, por exemplo, produzir quase toda a comida que o alimenta. (Maneco)
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