Desconhecer Foucault é estar exilado de nosso próprio tempo
Diário Gauche
A era da suspeita
Na quarta-feira (25/6), a morte de Michel Foucault completará 30 anos. Um dos mais influentes filósofos da segunda metade do século 20, Foucault produziu uma obra inovadora por seu método e por seus objetos. Obra cuja influência só aumentou desde sua morte, chegando hoje à condição de incontornável.
Não há setor das ciências humanas, da filosofia à história, da crítica literária aos estudos de comunicação, do direito à sociologia no qual não encontraremos problemas foucaultianos em operação. Na verdade, Foucault se transformou em um desses autores cujo desconhecimento implica divórcio profundo a respeito dos modos de pensamento que marcam nossa época. Quer dizer, desconhecer Foucault é estar exilado de nosso próprio tempo.
De fato, Michel Foucault conseguiu produzir dois feitos notáveis: complexificar nossa compreensão a respeito dos mecanismos de funcionamento do poder e injetar uma desconfiança profunda a respeito do pretenso realismo de conceitos e práticas científicas, em especial no campo das ciências humanas e das práticas clínicas.
Como se não fosse o bastante, seus últimos trabalhos compõem uma reflexão sistemática a respeito de um modo de autonomia e governo de si que abre caminhos para a reflexão ética distantes daqueles que a filosofia moderna conheceu, com sua fixação pelas figuras jurídicas da lei, do tribunal e da norma universalizável. Dessa forma, nasce uma experiência filosófica na qual epistemologia, ética e teoria social caminham de forma compacta.
Foi Foucault quem mostrou, de maneira mais sistemática, que nada entenderemos do poder enquanto o pensarmos a partir da temática da dominação das vontades, ou seja, o exercício do poder como sobreposição de uma vontade à outra. A verdadeira dimensão decisiva do poder se encontra nas disciplinas que sujeitam a todos por meio de instituições como a família, as prisões, as escolas, empresas, o Estado.
Tais disciplinas não são fruto da vontade de uma classe ou de um grupo. Elas resultam, na verdade, de uma vontade de saber que, ao mesmo tempo, nos sujeita e nos constitui. Ela está presente em nossos discursos científicos e na maneira por meio da qual eles moldam nossas vidas, organizam nossos conceitos de saúde e de doença, de sexualidade, de normalidade e de patologia, de regra e de desvio.
Dessa forma, Foucault deu instrumentos para que nossa época desenvolvesse sua capacidade de suspeita e desconfiança em relação a suas próprias ideias de progresso e de esclarecimento. Por isso, ele será sempre um dos nossos mais claros contemporâneos.
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