domingo, 25 de março de 2012

"O computador fala, eu estou calado..." e o mundo real? o virtual se tornou real?


Twitter, Facebook, e o fim de nossas vidas

Marcelo Carneiro da Cunha no SUL 21


Pois estadíssimos sulvinteumenses, leio que o meu, o seu, o nosso Twitter de cada dia completa hoje seis anos de crescimentos e sucessos, chegando aos 140 milhões de usuários no mundo todo.
Todos lemos, faz pouco, que o lançamento das ações do Facebook poderia chegar aos 100 bilhões de dólares, tornando multimilionário o sortudo do artista que decorou os escritórios da empresa quando ela era novinha e só podia pagar em sonhos, não em dinheiro. Esse é o admirável mundo novo em que fomos jogados, querendo ou não, estimados leitores.
Na semana passada eu contei a vocês que fui ao interior de São Paulo para a turnê mundial do concurso de beleza literária que o Carpinejar e eu inventamos. Viajamos por mais de 1300 quilômetros de canavial e laranjal, quatro dias na estrada, levando literatura de qualidade a todos os sedentos por ela. Uma missão salvadora, praticamente.
Em um momento, olhando para nós, os missionários, vi o Carpinejar e a Lorena Martins grudados nos seus notebooks, com chips de conexão 3G trabalhando como se estivessem em casa ou no escritório, e não em um carro viajando entre Marília e Araçatuba. Já eu, muito mais profundo, via uma comédia americana no meu celular, em alta definição e com legendas em português que eu adicionei ao vídeo, e o celular conseguiu sincronizar com o filme.
Que tempos, estimados leitores, que tempos.
O Carpinejar disse que segue sendo viciado em jornais de papel, aqueles que jogam na porta da gente e algum vizinho sempre aproveita antes que a gente acorde. Lorena não consegue começar o dia sem o café e uma Folha de SP, Ilustrada, claro. Já eu, menos comprometido com o século 20, assino jornais que depois não abro. Por que ler algo que já lemos ontem, eu me pergunto?
E então vem o infernal Twitter pra radicalizar ainda mais a coisa toda. Por que o Twitter corta ainda mais os caminhos entre nós e a informação, bagunçando ainda mais o que já bagunçado está – a nossa cabecinha analógico-digital, perdida entre dois séculos, entre páginas e a ausência delas. Pobres de nós.
O Twitter é uma dessas coisas que desatam nós e criam outros. Elas são ao mesmo tempo problema e solução, numa dualidade parecida com a do elétron e sua dificuldade em escolher se se trata de uma partícula ou de uma onda, algo que não faz nenhum sentido no mundo dos elétrons, aparentemente.
Nesse mês eu vou ver a primeira exibição para um seleto e reduzido público do filme que fizeram com um livro meu, Insônia. Insônia, pra quem não sabe, é um livro apoiado na internet. Quem o lê hoje acha tudo normal, mas quando escrevi o livro, a internet tinha apenas dois meses de idade no Brasil, nos tempos de antanho de 1996. Aquilo que hoje parece tão óbvio a quem lê o livro, simplesmente ainda não existia ou não era conhecido quando criei a história. Literatura também especula com o futuro, caros leitores, com resultados talvez um teco melhores do que os da astrologia e outras ciências inexistentes.
Para mim, o que quer que a internet viesse ainda a ser, naquele distante ano, estava na cara que o futuro seria do balacobaco, que nada seria como antes, que tudo que era sólido viraria pó, como aconteceu com a indústria do disco, com as vídeolocadoras, as cartas postais, com as revistas e jornais, como começa a acontecer com o cinema e a tevê. A internet veio, para de um jeito ou de outro, sacudir com tudo.
Nesse exato instante em que falamos e em que o Twitter chega à maioridade com seus seis anos, alguém, em algum lugar, está inventando um dos muitos aplicativos que vai surgir para reorganizar uma ordem criada há tão pouco. Mal criamos um hábito e já surge o seu destruidor, nesse tempo de coisas passageiras.
Em dois anos eu fui de um desinteressado a um tuitedependente, e é lá que eu busco grande parte das informações que eu utilizo no meu dia a dia, ou que eu uso para me orientar em relação a temas do presente mais absurdamente presente. O Twitter é, na verdade, a reinvenção da bússola.
Lembrem que aquela revolução espanhola de poucos anos atrás, quando o governo de direita tentou colocar a explosão dos trens em Madri na conta do ETA, a revolução que virou a eleição na véspera, foi feita com mensagens de celular, algo relativamente convencional no mundo mutante da internet. Nesse ano passado, a Primavera Árabe foi viabilizada pelas redes sociais, pelos smartphones que passaram a comandar a conquista de corações e mentes no mundo inteiro, para o que se passou no Irã, para o que aconteceu finalmente na Tunísia, no Egito, na Líbia, no que agora tenta acontecer na Síria.
O admirável mundo novo, nesse momento, é comandado por telinhas, estimados leitores. É nelas que vemos o que acontece, o que vai acontecer. Nosso mundo aumentou enormemente, e agora cabe em telinhas. Esse é o nosso paradoxo, de vivermos em um enorme universo de 140 caracteres e telas de 4 polegadas. Minimizamos espaços, maximizamos compartilhamentos. E assim vamos, virar o que estamos virando, o que quer que isso seja, ao ritmo de bits e bytes, amém. Boa sorte para todos nós, é o que eu nos desejo.
Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.

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