Orgulho hétero reflete uma história de preconceito
Esta polêmica do Dia do Orgulho Hétero aprovado pela Câmara de Vereadores paulistana me faz lembrar minha infância. Foi um dia numa aula do colégio. Nós discutíamos o preconceito de um modo geral, ou algo assim. Na verdade, nem lembro bem como o tema surgiu, mas acabamos falando da relação do Brasil com os negros. Os meus colegas, com seus lá 10, 12 anos, argumentavam que se o negro pode usar uma camiseta com a inscrição “100% negro”, seria direito igual do branco levar a frase “100% branco” no corpo. O objetivo era demonstrar que o negro estava sendo preconceituoso com o branco ao defender sua negritude. Na época, não conseguia verbalizar o quão ridículo era o argumento e por que a tal camiseta seria uma demonstração de preconceito. Eu sentia isso, mas não sabia bem como dizer. Acho que acabei perdendo o debate, ou fui salva pela professora, que me apoiava, não lembro bem.
O Dia do Orgulho Heterossexual equivale em preconceito ao “100% branco” da camiseta cujo uso meu colega defendia como questão de igualdade. É a mesma falsa igualdade em que se baseia o neoliberalismo, mas mais adiante eu chego lá. Não há igualdade de ações entre desiguais em direitos. O negro afirma-se enquanto negro porque precisa mostrar que não tem vergonha de ser como é. Porque durante sua vida inteira, e a de seus pais e avós, a sociedade lhe disse que ser negro era motivo de vergonha. Nunca ninguém disse isso ao branco. Nunca ninguém disse isso ao homem branco heterossexual. Ele não precisa se afirmar sobre os outros porque ele sempre exerceu domínio sobre os outros. Afirmar-se e regozijar-se por ser homem é machismo. Da mesma forma, por ser branco e por ser heterossexual é igualmente preconceito, porque ele concorda implicitamente com a afirmação histórica de sua suposta superioridade.
Repito, não é possível ações iguais para desiguais em direitos. É com o discurso da igualdade que o neoliberalismo defende que o Estado não invista no social. Não são todos iguais? Todos podem chegar lá, afinal. E aí louvam-se as histórias do cara pobre, que não tinha nada, nenhuma oportunidade, e trabalhou, batalhou e, sozinho, ficou rico. Ah, então todos podem.
Necas!
O cara é exceção. Pergunta quantos da favela e quantos da Zona Sul se deram bem. O resultado não vem de nenhum fator genético e tampouco é mera coincidência. O cara da Zona Sul tem muito mais chances de ter uma vida boa, porque teve mais acesso a educação de qualidade, teve formação mais estável e tudo o mais.
O discurso de igualdade defendido pelos homofóbicos paulistas demonstra justamente isso: homofobia. Com a aprovação do Dia do Orgulho Hétero, eles mostram acreditar que a sociedade trata igual homossexuais e heterossexuais. No fim das contas, demonstram concordar com esta desigualdade e esta discriminação históricas.
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