Um balaço que feriu todo o Chile
Na noite de 24 de agosto, último dia da greve nacional convocada pela Central Unitária de Trabalhadores (CUT), Manolito saiu de sua casa para acompanhar seu irmão Gerson, em uma cadeira de rodas, a fim de observar os “panelaços” da população contra o atual governo de direita, presidido por Sebastian Piñera. Mas Manuel nunca voltou para casa. Uma bala perdida o atingiu no tórax. A reportagem é de Christian Palma, correspondente da Carta Maior em Santiago.
Christian Palma – Correspondente da Carta Maior em Santiago (@chripalma)
Manuel Gutiérrez Reinoso tinha 16 anos e era um fiel integrante da Igreja Metodista Pentecostal, da vila Jaime Eyzaguirre, um dos setores populares da comunidade de Macul, localizada na zona sudeste de Santiago. Na noite de 24 de agosto, último dia da greve nacional convocada pela Central Unitária de Trabalhadores (CUT), “Manolito” saiu de sua casa para acompanhar seu irmão Gerson, em uma cadeira de rodas, a fim de observar os “panelaços” da população contra o atual governo de direita, presidido por Sebastian Piñera.
Mas Manuel nunca voltou para casa. Uma bala perdida o atingiu no tórax. “Estávamos caminhando na direção da passarela que está no final da rua quando apareceu um carro patrulha dos carabineiros e eles começaram a disparar. Estou certo que foram eles. Um dos tiros atingiu meu irmão no peito e ele caiu no chão”.
Os dois irmãos estavam acompanhados pelo amigo Giuseppe Ramírez, de 19 anos, quando escutaram o ruído três tiros. “Manuel colocou a mão no peito e me disse “me acertaram”. Estava cheio de sangue e tentei animá-lo, despertá-lo, para que não dormisse, e ele me dizia estou bem, irmão, tranquilo, vou sair desta”, contou entre soluços Gerson Gutiérrez.
Jacqueline, outra irmã da vítima, relatou que, no princípio, acharam que o jovem tinha sido ferido por um estilhaço ou por uma bala de borracha, “mas depois os médicos nos disseram que não puderam salvá-lo, porque era uma bala de grosso calibre”.
A natureza do projétil, precisamente, é fundamental para determinar sua origem e os eventuais responsáveis. A bala foi extraída do corpo de Manuel Gutiérrez durante a autópsia que ocorreu na sexta-feira no Serviço Médico Legal (SML) e entregue aos peritos da Polícia para análise.
“Era um bom estudante, um exemplo para seu colégio, era um jovem tremendamente cristão”, conta sua irmã, o que foi corroborado por seus vizinhos.
Dois dias depois da tragédia, começou a discussão entre aqueles que imputam a morte do jovem aos carabineiros e os meios de comunicação próximos ao governo que se inclinam pela tese de que Manuel teria relações com uma das gangues que operam nos bairros populares e que o assassinato teria sido resultado de um ajuste de contas entre torcidas organizadas de futebol.
No entanto, o testemunho do irmão da vítima abriu uma investigação para ver se, efetivamente, as forças policiais abriram fogo. Frente a estas acusações, o general Sergio Gajardo, segundo chefe da Zona Metropolitana de Carabineiros, descartou que os efetivos da corporação estejam envolvidos no ocorrido. “Sei que há uma versão de pessoas que estavam com ele, que teria passado um veículo pelo lugar onde estavam e que atribuíram o tiro aos carabineiros”.
O subsecretário do ministério do Interior, Rodrigo Ubilla, pediu que se deixe as instituições investigarem de maneira efetiva a morte de Manolito e pediu que “não se especule” sobre o fato. “O governo espera de forma decidida que tudo se resolva de maneira rápida e que se esclareça o falecimento deste jovem”, acrescentou.
Segundo Ubilla, “frente à morte de qualquer cidadão, de qualquer pessoa, a situação é gravíssima. Vínhamos dizendo isso há bastante tempo. Neste cenário, devemos manter uma atitude responsável e não especular. Deixemos que as instituições trabalhem. Neste momento, a informação está chegando à Justiça que é quem tem a tarefa de esclarecer o caso”.
A prefeita de Santiago, Cecilia Pérez, disse que o fato deve ser investigado e que ninguém deve se apressar a emitir juízos. Já o porta-voz Andrés Chadwick afirmou que é preciso ser cauteloso neste momento e esperar o informe dos investigadores para determinar as circunstâncias da morte.
Mas, ainda que as autoridades do governo se apressem em descartar a participação dos carabineiros, o certo é que, nos últimos dois dias de greve, os policiais cometeram uma série de graves erros em outras zonas periféricas da cidade, como ter ingressado a força em casas de bairros populares ou ter lançado bombas de gás lacrimogêneo no interior de alguns sindicatos sem que tivesse ocorrido provocação alguma.
Miguel Fonseca, vizinho de Manuel e porta-voz da família, disse à Carta Maior que serão apresentadas seis testemunhas sobre o caso. Além de Gerson e Giuseppe, testemunharão três vizinhos e outro jovem atingido por uma bala no braço perto de onde Manuel foi morto, bala esta que ainda não foi retirada do seu corpo.
A morte de Manuel da populosa Vila Jaime Eyzaguirre demonstrou que a repressão dos Estado ocorre de forma mais visível nas zonas periféricas da cidade. Na tarde de sexta, as estreitas ruelas deste bairro popular estavam de luta pela perda do vizinho. Sua Igreja organizou uma despedida de acordo com a fé que o jovem professava, uma esperança de uma vida melhor, o que também pedem milhões de chilenos.
Enquanto isso, Mireya Reinoso, mãe de Manuel, vela o filho falecido na igreja localizada a duas quadras de sua casa. A mulher se aferra à fé para suportar tanta dor. Generosa, também pede que se faça justiça para que esta tragédia não se repita. “Nada vai devolver o meu filho, mas creio que poderiam ter disparado para o ar, poderiam ter se dado conta de que estavam fazendo algo errado, mas sei que a justiça vem de cima. É uma dor muito grande”, disse entre lágrimas.
Tradução: Katarina Peixoto
Mas Manuel nunca voltou para casa. Uma bala perdida o atingiu no tórax. “Estávamos caminhando na direção da passarela que está no final da rua quando apareceu um carro patrulha dos carabineiros e eles começaram a disparar. Estou certo que foram eles. Um dos tiros atingiu meu irmão no peito e ele caiu no chão”.
Os dois irmãos estavam acompanhados pelo amigo Giuseppe Ramírez, de 19 anos, quando escutaram o ruído três tiros. “Manuel colocou a mão no peito e me disse “me acertaram”. Estava cheio de sangue e tentei animá-lo, despertá-lo, para que não dormisse, e ele me dizia estou bem, irmão, tranquilo, vou sair desta”, contou entre soluços Gerson Gutiérrez.
Jacqueline, outra irmã da vítima, relatou que, no princípio, acharam que o jovem tinha sido ferido por um estilhaço ou por uma bala de borracha, “mas depois os médicos nos disseram que não puderam salvá-lo, porque era uma bala de grosso calibre”.
A natureza do projétil, precisamente, é fundamental para determinar sua origem e os eventuais responsáveis. A bala foi extraída do corpo de Manuel Gutiérrez durante a autópsia que ocorreu na sexta-feira no Serviço Médico Legal (SML) e entregue aos peritos da Polícia para análise.
“Era um bom estudante, um exemplo para seu colégio, era um jovem tremendamente cristão”, conta sua irmã, o que foi corroborado por seus vizinhos.
Dois dias depois da tragédia, começou a discussão entre aqueles que imputam a morte do jovem aos carabineiros e os meios de comunicação próximos ao governo que se inclinam pela tese de que Manuel teria relações com uma das gangues que operam nos bairros populares e que o assassinato teria sido resultado de um ajuste de contas entre torcidas organizadas de futebol.
No entanto, o testemunho do irmão da vítima abriu uma investigação para ver se, efetivamente, as forças policiais abriram fogo. Frente a estas acusações, o general Sergio Gajardo, segundo chefe da Zona Metropolitana de Carabineiros, descartou que os efetivos da corporação estejam envolvidos no ocorrido. “Sei que há uma versão de pessoas que estavam com ele, que teria passado um veículo pelo lugar onde estavam e que atribuíram o tiro aos carabineiros”.
O subsecretário do ministério do Interior, Rodrigo Ubilla, pediu que se deixe as instituições investigarem de maneira efetiva a morte de Manolito e pediu que “não se especule” sobre o fato. “O governo espera de forma decidida que tudo se resolva de maneira rápida e que se esclareça o falecimento deste jovem”, acrescentou.
Segundo Ubilla, “frente à morte de qualquer cidadão, de qualquer pessoa, a situação é gravíssima. Vínhamos dizendo isso há bastante tempo. Neste cenário, devemos manter uma atitude responsável e não especular. Deixemos que as instituições trabalhem. Neste momento, a informação está chegando à Justiça que é quem tem a tarefa de esclarecer o caso”.
A prefeita de Santiago, Cecilia Pérez, disse que o fato deve ser investigado e que ninguém deve se apressar a emitir juízos. Já o porta-voz Andrés Chadwick afirmou que é preciso ser cauteloso neste momento e esperar o informe dos investigadores para determinar as circunstâncias da morte.
Mas, ainda que as autoridades do governo se apressem em descartar a participação dos carabineiros, o certo é que, nos últimos dois dias de greve, os policiais cometeram uma série de graves erros em outras zonas periféricas da cidade, como ter ingressado a força em casas de bairros populares ou ter lançado bombas de gás lacrimogêneo no interior de alguns sindicatos sem que tivesse ocorrido provocação alguma.
Miguel Fonseca, vizinho de Manuel e porta-voz da família, disse à Carta Maior que serão apresentadas seis testemunhas sobre o caso. Além de Gerson e Giuseppe, testemunharão três vizinhos e outro jovem atingido por uma bala no braço perto de onde Manuel foi morto, bala esta que ainda não foi retirada do seu corpo.
A morte de Manuel da populosa Vila Jaime Eyzaguirre demonstrou que a repressão dos Estado ocorre de forma mais visível nas zonas periféricas da cidade. Na tarde de sexta, as estreitas ruelas deste bairro popular estavam de luta pela perda do vizinho. Sua Igreja organizou uma despedida de acordo com a fé que o jovem professava, uma esperança de uma vida melhor, o que também pedem milhões de chilenos.
Enquanto isso, Mireya Reinoso, mãe de Manuel, vela o filho falecido na igreja localizada a duas quadras de sua casa. A mulher se aferra à fé para suportar tanta dor. Generosa, também pede que se faça justiça para que esta tragédia não se repita. “Nada vai devolver o meu filho, mas creio que poderiam ter disparado para o ar, poderiam ter se dado conta de que estavam fazendo algo errado, mas sei que a justiça vem de cima. É uma dor muito grande”, disse entre lágrimas.
Tradução: Katarina Peixoto
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