Tarso Genro: Serra rememora a linguagem golpista pré-64
Serra se aproxima de ‘linguagem golpista e fascista’, diz Tarso
Em entrevista ao iG, ex-ministro diz que tucano comete ‘equívoco’ ao endossar acusações feitas pelo vice Indio da Costa ao PT
Ricardo Galhardo, enviado ao Rio Grande do Sul | 29/07/2010 13:23
Líder nas pesquisas de opinião para o governo do Rio Grande do Sul, o ex-ministro da Justiça Tarso Genro (PT) diz que o presidenciável tucano José Serra se aproxima da linguagem golpista e facista que levou ao golpe militar de 1964 ao endossar as declarações de seu vice, Indio da Costa, que acusou o PT de estar ligado às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e ao narcotráfico.
Por outro lado, Tarso, que trava uma disputa dura com José Fogaça (PMDB), afirma que não pretende explorar na campanha os escândalos que marcaram a gestão da governadora tucana Yeda Crusius, terceira colocada nas pesquisas e que pode ser o fiel da balança em um eventual segundo turno. De olho nos votos tucanos, ele classifica como irracional a polarização que acompanha a política gaúcha desde a Revolução Farroupilha, no século 19.
“Todos sabemos qual é o problema que cada partido teve no verão passado”, disse Tarso ao iG, em entrevista concedida ao lado da lareira de sua casa no bairro Rio Branco, em Porto Alegre, na noite de quarta-feira.
iG – Qual é sua opinião sobre as declarações de Serra e seu vice quanto à ligação do PT com as Farc e o narcotráfico?
Tarso Genro – É um equívoco do Serra. Acho que ele tem estatuto político para não rememorar uma linguagem golpista que foi construída em 1964 e naquela época apenas substituía Farc por União Soviética e usava a mesma expressão “república sindicalista”. Espero sinceramente que isso seja mais um ato de solidariedade ao seu vice – que é notoriamente uma pessoa atrasada e reacionária – do que uma posição dele, uma pessoa que tem estatuto político para compreender que isso aí não leva a nada, só o desqualifica como figura pública.
iG – Mas o próprio Serra chegou a vincular o governo com o narcotráfico quando citou a Bolívia.
Tarso – Essa visão do Serra sobre vínculos com o narcotráfico de qualquer agremiação política é uma imputação que não condiz com o estatuto democrático do próprio Serra, porque é incriminação e pronto. É uma acusação que tem um corte ideológico facista que não é compatível nem com o Serra nem com o PSDB. O combate que o governo fez ao narcotráfico e às cooperações que fizemos neste sentido com países da América do Sul foram uma característica do governo Lula.
iG – A tentativa de identificar Dilma com a ala radical do PT, como aconteceu no episódio do programa de governo, pode atrapalhar?
Tarso – Isso é o mesmo que nós querermos identificar toda a oposição com aquele coronel facistóide do Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro. Seria um equívoco. Essa linguagem de apontar os adversários como extremistas é uma linguagem da Guerra Fria. Isso não funciona mais. De uma parte porque aquela visão de Guerra Fria que tinha um inimigo com guizo vermelho do outro lado já não tem mais consistência. De outra parte porque o próprio sistema capitalista mundial, com o seu desenvolvimento globalizado tem disseminado os valores da democracia. Não há mais uma consciência que seja suscetível de ser trabalhada com essa visão da Guerra Fria.
iG – Se eleita, Dilma terá condições de fazer um governo mais à esquerda do que Lula?
Tarso – É inviável hoje qualquer proposta de desenvolvimento de um país e de sustentabilidade política de um governo que não tenha o centro como aliado. Até um dos grandes elementos positivos do projeto político do presidente foi despertar a necessidade do centro no País. Eu diria meio fisiológico, meio desideologizado, mas ainda é o centro político. É quem dá sustentabilidade a qualquer projeto. Creio que a Dilma vá governar com esse mesmo espectro político, com todas as grandezas e limitações que esse espectro possui. Não creio que vá ser mais ou menos radical que o do Lula.
iG –Além de fisiológico e desideologizado, o centro também agrega políticos com histórico de corrupção. O senhor lutou muito contra isso dentro do PT.
Tarso – O problema é que esses desvios existem em todos os partidos e não pode haver uma impugnação dos partidos. Se nós fizermos uma incriminação em grupo estaremos tendo uma posição medieval do ponto de vista do direito. Não podemos incriminar todo um bloco social ou toda uma comunidade. Os partidos reais são estes que estão aí. Qualquer governo precisa estabelecer um sistema de alianças e, seguramente, se o Serra ganhar a eleição – acredito que não vai ganhar – quem governaria com a parte mais difícil de ser contida seria ele e não a Dilma.
iG – Os escândalos que atingiram outros partidos varreram a discussão ética para debaixo do tapete nesta campanha?
Tarso – A questão ética não pode substituir o jogo da política sob pena de nós cairmos em campanhas que sejam concursos de moralismo, às vezes falso moralismo. Um governo tem que se destacar é atuando fortemente contra a corrupção e a ilegalidade como o governo Lula tem feito. É o governo que mais combateu a corrupção na história do País até hoje e me orgulho de ter tido um papel importante nisso.
iG – O pior desempenho de Dilma é na região Sul. Por outro lado o senhor lidera as pesquisas no Estado mais importante da região. É um paradoxo?
Tarso – Eu e a Dilma temos mais ou menos a mesma pontuação aqui. O que diferencia é que os meus adversários têm menos pontuação que o Serra. Não há dicotomia. Temos que crescer. Tanto eu quanto ela precisamos crescer e isso vai ocorrer fortemente quando houver conexão mais forte da minha campanha com a dela com a presença do presidente Lula (que participa nesta quinta-feira de comício em Porto Alegre).
iG – O senhor fica incomodado com o fato de o PMDB, que integra a base de Dilma, ter candidato ao governo em coligação com o PDT, que também integra a aliança de Dilma?
Tarso – Não há problema. Nós queríamos que o PMDB apoiasse a Dilma, que ela tivesse dois palanques ou até três aqui. O PMDB fez uma espécie de logro ao PDT. Prometeu apoio à Dilma, sancionado pelo presidente Carlos Lupi, e depois não apoiou. O PDT foi induzido a erro. Nós queremos que o PMDB apoie a Dilma. Que seja bem vindo. O nosso contencioso com o PMDB aqui no Estado não deveria prejudicar o apoio nacional. O fato é que foi uma escolha do PMDB e não nossa.
iG – Alguns dirigentes do PDT gaúcho acusam o PT de aliciar seus quadros. Isso pode causar turbulências à campanha de Dilma?
Tarso – Isso é uma coisa que não se sustenta. Os quadros do PDT são maduros, experientes, não se deixariam aliciar. As pessoas se inclinaram à minha candidatura e à da Dilma porque o PMDB não está apoiando a Dilma e então se sentiram liberadas. Mesmo que o PDT não nos apóie nós vamos convida-lo para participar do nosso governo porque o PDT tem muito mais identidade programática conosco do que o PMDB.
iG – O senhor pretende explorar os escândalos do governo Yeda Crusius (PSDB) na campanha?
Tarso – Todos nós sabemos que tem diferenças éticas entre nós e todos nós sabemos qual é o problema que cada partido teve no verão passado. Mas esta questão está sendo tratada de uma maneira muito elevada. Todos nós estamos apresentando qual é nossa posição para promover o combate à corrupção no Estado sem qualquer tipo de acusação pessoal. Isso é um sinal de mudança política aqui no Estado e de qualificação. É uma renovação no debate político de um estado que sempre esteve muito polarizado, às vezes meio irracional.
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