Adão Villaverde: “Grande expectativa é sintonizar o Rio Grande com o momento nacional”
Sul21
Felipe Prestes
Futuro presidente da Assembleia Legislativa, em 2011, Adão Villaverde (PT) considera que a eleição de Tarso Genro (PT), em primeiro turno, gera grande expectativa no estado. O deputado estadual, que vai para seu terceiro mandato, acredita que a eleição de Tarso representa o desejo da população gaúcha de ter o governo estadual em sintonia com o federal. “A grande expectativa é sintonizar o Rio Grande com o momento positivo nacional”, afirma.
Para Villaverde, também a Assembleia Legislativa deve estar conectada a uma retomada de desenvolvimento, oportunidade que diz ter sido desperdiçada pelo governo Yeda Crusius. “Não temos aproveitado à altura o ritmo de crescimento do país”.
O futuro presidente afirma que a Assembleia deve “voltar a debater grandes temas” na próxima legislatura, como a redução das desigualdades regionais no estado, o efeito das questões climáticas no RS e, até mesmo, a reforma política, algo que só pode ser decidido em Brasília. “Precisamos criar um movimento no estado (em torno da reforma política)”.
Villaverde anuncia uma mudança na Assembleia para o próximo ano: as quatro maiores bancadas da próxima legislatura (PT, PMDB, PP e PDT) já operam informalmente um comitê gestor, para evitar rupturas entre as administrações anuais, que ficarão a cargo de cada uma destas siglas. Ele afirma também que pretende ampliar a participação da sociedade nos debates feitos pelo Legislativo gaúcho.
Em entrevista ao Sul21, Adão Villaverde falou ainda sobre o salário dos parlamentares e as coalizões formadas por Dilma Rousseff e Tarso Genro.
Sul21: Quando seu nome era ventilado para o secretariado e, depois, quando o senhor pleiteava a presidência da AL, dizia-se que as resistências a seu nome se deviam a sua capacidade de articulação, porque, por esta capacidade, seria mais importante que o senhor ocupasse a liderança de governo. O senhor vê nisto uma deferência ou uma desfeita? Por que manifestou que não gostaria de ocupar a liderança de governo, e sim a presidência da AL?
Adão Villaverde: O fato de meu nome ter sido levantado para o secretariado e, também, para a liderança de governo, por um conjunto de setores do partido, é porque eles entendiam que o núcleo de representação das relações políticas de governo e o papel que o governo deveria exercer na Assembleia necessitavam de um quadro político com muitas relações e com muito trânsito nestes espaços. Acho que por esse motivo meu nome foi levantado tanto para secretário de estado quanto para líder de governo. Mas acho que o espaço de presidente da Assembleia coroa duas coisas. A primeira, o reconhecimento de parte do partido que, de forma unânime, oferece meu nome. A segunda, que é resultado de um largo processo de construções e relações ao longo de minha trajetória política.
“A Assembleia não deixará de cumprir suas funções fundamentais, de controle, fiscalização, elaboração de leis”Sul21: Se fala muito na autonomia do Legislativo em relação ao Executivo…
AV: Todo mundo sabe que eu tenho identidade política e programática com o projeto vitorioso e também com o governador. Mas eu serei o presidente de um dos poderes, que é autônomo e independente, e que precisa se relacionar de forma harmônica com os outros, fundamentalmente com o Poder Executivo. Assim vamos fazer. Principalmente mediar as relações com o Executivo quando isto for necessário. Mas tenho certeza que a Assembleia Legislativa deverá no próximo período estar à altura do momento histórico que se abre no Rio Grande do Sul com a vitória da Unidade Popular pelo Rio Grande. Ela saberá estar presente para ajudar nos grandes temas e grandes questões do Rio Grande. E deverá ajudar também a reposicionar o Rio Grande no papel que ele merece neste novo concerto das relações federativas, que foram produzidas pelo presidente Lula.
Sul21: Que mudanças ocorrem com a chegada de Tarso Genro ao governo do estado? Quais os grandes temas a serem discutidos? Que panorama nacional é este?
AV: Há uma grande expectativa no RS, a partir desta vitória no primeiro turno do governador eleito. E a grande expectativa é sintonizar o Rio Grande com o momento positivo nacional. Eu tenho certeza que a Assembleia vai apreender isto e será capaz de produzir uma agenda política e de gestão que a coloque à altura destas demandas. Que ela possa ajudar o estado a crescer, se desenvolver, a inovar, a dar sustentabilidade às suas relações econômicas, sociais e culturais. E, principalmente, a fazer com que o estado consiga aprofundar aquelas questões que deverão passar por debate na Assembleia e que terão que ser chanceladas pelos deputados. De outro lado, a Assembleia não vai deixar de fazer as suas funções fundamentais, de controle, fiscalização, elaboração de leis.
Sul21: O senhor espera uma Assembleia mais afinada com as questões do estado e menos preocupada em disputas entre oposição e base governista?
AV: Eu não vejo problema em explicitar divergências, nem mesmo quando elas levam a conflitos. Ao contrário, conflitos são inerentes à democracia. Vejo um problema quando não se sabe dar soluções, superar situações conflitantes. Aí sim, vejo problema. Portanto, o importante é que possamos explicitar bem nossas diferenças e, a partir delas, possamos construir consensos majoritários, opiniões convergentes que vão ao encontro das grandes necessidades da sociedade gaúcha.
“Não temos aproveitado à altura o ritmo de crescimento do país”Sul21: Qual o papel do presidente da AL na busca destas convergências e qual o papel dos líderes das bancadas e de governo?
AV: Todos têm seus papéis. O Executivo tomando suas iniciativas, apresentando seus projetos e a oposição estabelecendo contraponto, suas considerações críticas, quando necessárias. A Casa deve procurar construir saídas hegemônicas, que sejam capazes de se tornarem reais alternativas para as necessidades do Rio Grande. As necessidades do Rio Grande são fazer com que o estado não perca este momento singular da história política do Brasil, de se desenvolver, gerar emprego e renda.
Sul21: O senhor acha que este momento tem sido desperdiçado no RS?
AV: Acho que tem sido desperdiçado. Não temos aproveitado à altura o ritmo de crescimento do país.
Sul21: O senhor cita ‘grandes temas’, ‘grandes necessidades’. Quais serão as discussões mais importantes na Assembleia durante o governo Tarso?
AV: O enfrentamento das desigualdades regionais. Isto é uma grande questão. A Assembleia não pode abdicar de debater os rumos do desenvolvimento do estado. A retomada das funções públicas de estado, que o RS perdeu no último período. As questões climáticas e seus efeitos no estado. O tema da reforma política, por exemplo.
Sul21: A reforma política não é uma questão para ser discutida no Congresso?
AV: Evidente que não, a reforma política é uma questão nacional.
Sul21: O que pode ser feito em âmbito estadual?
AV: Nós precisamos criar um movimento no estado para fortalecer a ideia de superação deste padrão de financiamento de campanha, a distorção na representação dos estados.
“A Assembleia tem de voltar a debater os grandes temas. Isto é o que a sociedade espera do Parlamento”Sul21: A ideia seria pressionar os parlamentares no Congresso?
AV: Construir uma agenda para a realização da reforma política. Nós não poderíamos enfrentar mais uma eleição nas condições em que enfrentamos a eleição atual. (…) A Assembleia Legislativa precisa inovar no seu processo legislativo, nos seus debates, na sua relação com a sociedade. A AL não pode se despregar das relações que dão origem às representações na Casa. Ela tem que voltar a debater os grandes temas. Isto é o que a sociedade espera do Parlamento e, obviamente, fazer a fiscalização e elaborar as leis.
Sul21: A Assembleia já não discute temas importantes para o estado nos fóruns e comissões?
AV: Você tem que fortalecer o trabalho das comissões na AL, fortalecer o papel das audiências públicas, fortalecer o debate dos projetos que entram na Casa. Estes debates precisam ser mais amplos, com mais contrapontos, ter relações mais fortes com a sociedade.
Sul21: É preciso ter ainda mais debates, ou fazer com que o trabalho das comissões, os fóruns e audiências públicas ganhem mais corpo, tragam mais contribuições concretas?
AV: Não há contradição entre um e outro. Mais debates e mais contribuições concretas.
“Comitê de gestão vai permitir a continuidade nas questões administrativa da Assembleia”Sul21: Como fazer para que as conclusões de debates na Assembleia se tornem soluções reais?
AV: Trazer a sociedade para dentro da Assembleia, para que ela não seja meramente ouvinte. Seja protagonista e influencie nos rumos dos projetos.
Sul21: O senhor já sabe que questões de gestão da Assembleia devem ser aperfeiçoadas?
AV: Uma das questões importantes que vamos trabalhar é a ideia de criar um comitê de gestão para os quatro anos, com os partidos que presidirão a Casa. Terá alternância na presidência, mas vai ter continuidade na gestão. Ou seja, haverá continuidade nas questões administrativas, no gerenciamento da estrutura da Casa, para que a AL não sofra uma descontinuidade.
Sul21: Então isto já vem sendo discutido entre as quatro maiores bancadas?
AV: Mais do que discutido, já vem sendo aprofundado. Já foi instalado informalmente inclusive este comitê de gestão.
Sul21: O futuro governador montou um governo de coalizão, mas o próprio deputado Raul Pont declarou que a coalizão só funcionará, de fato, no momento do voto na Assembleia. O senhor acredita que os partidos que compõem a coalizão já estão bem afinados?
AV: A política se divide em dois momentos: quando você a pensa e quando vai para a ação prática, que é quando você verifica se aquilo que formulou está correto. Do ponto de vista das reais necessidades da política, não tenho dúvida de que o governador está articulando a política de forma absolutamente correta, criando um grande governo de coalizão. Um governo que terá opiniões e posições, mas que também saberá respeitar a oposição e as opiniões divergentes. Agora, o real teste da base aliada na Casa, só será testado no momento em que os projetos forem enviados. A formulação do governador é correta.
“O partido que estrutura a coalizão tem que fazer as concessões”Sul21: Então o senhor concorda com a coalizão formada até aqui?
AV: Não tenho dúvida. Fui um dos defensores.
Sul21: O governo deixou pouco espaço para os aliados mais antigos?
AV: Este é ônus de um governo de coalizão. O partido que estrutura a coalizão, no caso, o PT, tem que fazer as concessões. É sempre assim.
Sul21: O senhor encara da mesma forma a composição do ministério da presidente eleita Dilma Rousseff?
AV: A presidenta Dilma aprofunda o governo de coalizão do presidente Lula. Consolida o bloco de forças que foi determinante para que o país voltasse a crescer, se desenvolver, gerar emprego e renda. O governo agora irá entrar em um novo padrão de responsabilidade, mas com um bloco mais consolidado do que no governo Lula.
Sul21: Quais serão suas bandeiras na nova legislatura? A que o senhor atribui a sua reeleição?
AV: Na minha experiência como deputado, as questões mais particulares sempre se subordinaram ao projeto mais geral. Por isso fui líder do presidente Lula (na Assembleia gaúcha) nos dois primeiros anos do primeiro mandato. Depois trabalhei projetos importantes, como é o caso da Lei de Inovação e da Lei de Controle do Enriquecimento Ilícito – chamada Lei Villaverde. Entendo que o tema da inovação tecnológica, da retomada do desenvolvimento em novas bases, é fundamental para o RS. O estado foi de ponta nesta área e perdeu esta condição. Entendo também que a questão da transparência, do controle público, de instrumentos para que a sociedade possa fiscalizar os gestores públicos é fundamental. Acho, inclusive, que a lei de minha autoria, que controla o enriquecimento ilícito, é um dos mais importantes instrumentos de controle sobre gestores públicos que se produziu no RS no último período. Acho que a visão de desenvolvimento, a compreensão da questão da inovação, do controle da gestão pública, a defesa do projeto nacional e da recuperação das funções públicas do estado são elementos que nortearam, ou orientaram meus quase 50 mil votos. Até porque eu praticamente tenho votos apenas em Porto Alegre. Sou um deputado de Porto Alegre e Grande Porto Alegre. Acho que pesou muito a ideia de um mandato de opinião.
Sul21: O senhor poderia explicar como é o mandato de opinião?
AV: É um mandato que tem influência na sociedade a partir das suas ideias, de suas posições e de suas iniciativas parlamentares. Um mandato onde pesa a opinião do deputado, um mandato de posicionamento.
Sul21: Sua bandeira mais específica é mesmo a área da Ciência e Tecnologia?
AV: Não, a gente trabalhou muito com setores mais excluídos, principalmente na questão de reciclagem, dos artesões, da economia solidária. Na questão do lixo eletrônico, trabalhamos muito este tema. Tive muito apoio de movimentos sindicais, por ter um mandato muito identificado com a luta dos trabalhadores. A relação com a educação, com a universidade, é outro tema que trabalhei muito. Acho que estes temas também nortearam a nossa eleição.
“Sempre afirmei que o chamado déficit zero era uma conta de chegada, que tirava recursos de áreas sociais”Sul21: Tem se discutido muito nesta semana a questão das finanças públicas do estado, que o atual governo apresenta como carro-chefe de sua administração. Que legado o governo Yeda Crusius deixa para o estado?
AV: Nós sempre dissemos que o equilíbrio fiscal não poderia se realizar à custa do equilíbrio social. Sempre afirmei que o chamado “déficit zero” era uma conta de chegada, que tirava recursos de áreas sociais e jogava eles para fechar as contas. O maior exemplo é o baixo investimento em áreas como saúde, educação e segurança pública. Uma visão abrangente da gestão pública tem que equilibrar as questões fiscais sem desequilibrar as sociais. Talvez esteja aí a nossa grande diferença com o governo Yeda. E vai se revelar que o equilíbrio das contas públicas não é tanto quanto se prega na hora em que o governador Tarso Genro e sua equipe assumirem o Executivo.
Sul21: O governo Yeda não teve méritos, por exemplo, ao voltar a pagar o funcionalismo em dia, a retomar a credibilidade do estado com fornecedores?
AV: Quem se elege ao governo tem que estar absolutamente preparado para pagar o funcionalismo em dia e para manter os fornecedores em dia. A população não elegeu o governo Yeda somente para isto. Isto era quase que uma obrigação do governo. A população elegeu o governo Yeda para fazer o estado crescer, para gerar emprego, gerar renda. E a mesma população que elegeu o governo Yeda não o reelegeu exatamente porque ele não fez isso. Pagou nas urnas. Aquilo que está sendo explicitado como mérito é mérito somente para a estrutura de governo, porque socialmente a população rejeitou o governo. E rejeitou com uma margem larga de diferença.
Sul21: Conversei com o deputado Elvino Bohn Gass (PT) na última sessão plenária da AL e ele afirmou que uma das coisas que precisam mudar na Casa é o fato de os deputados da base governista não exercerem a fiscalização. O senhor acredita que, no caso de uma eventual denúncia, por exemplo, a base aliada de Tarso vai apurá-la ou vai meramente defender o governo?
AV: Não tenho dúvida de que a fala é correta. Toda e qualquer denúncia que tenha consistência deve ser apurada. Espero que não se refute denúncias consistentes. É sempre bom que você faça denúncia com base consistente, porque isto obriga quem está sendo acusado a ter que, no mínimo, tomar medidas para dar transparência ao processo. Então estou de acordo que se deve enfrentar estas questões.
“Historicamente, o PT defende a diminuição da diferença entre os maiores e menores salários”Sul21: Os deputados votaram seus salários na AL na semana passada e uma das grandes queixas dos parlamentares era de que ganhavam bem menos que categorias de similar importância no Judiciário. Assim como os parlamentares, várias categorias buscam equiparação com alguma outra carreira e isto se torna um reajuste desenfreado. Como fazer para estancar isto?
AV: Este processo recente revelou três coisas. A primeira é que teto não pode virar indexador. Segundo, que os reajustes têm que se dar em parâmetros realistas. E terceiro, que não se pode deixar um prazo de quatro anos para se fazer reajustes. Tem que se diminuir estes espaços para que os índices que são tomados como referência não sejam desproporcionais aos outros reajustes de salário, seja no estado, seja no Brasil. Este processo recente revelou estas três limitações e elas têm que ser superadas. E há ainda um quarto e último elemento que é aquilo que formou a posição do PT. O partido historicamente defende a ideia de que você tem que diminuir a diferença entre os maiores e menores salários. Portanto, os reajustes das categorias com maiores salários deve se subordinar aos reajustes das categorias com menores salários. Por isto é que defendemos uma alternativa de índice a esta decisão tomada em Brasília.
Sul21: Mas não é necessário também um grande diálogo entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário estaduais para cessar aumentos que partem apenas dos interesses de cada categoria?
AV: Sim, mas os poderes não podem conversar apenas entre eles. É preciso que conversem com a sociedade e com o conjunto das categorias dos servidores públicos.
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