Para quem não aguenta mais me ver escrevendo sobre as chuvas, compre uma botina e uma capa.
Acordei imaginando quando é que os ocupantes de cargos públicos (de hoje e de ontem) que, através de sua incompetência ou indiferença, contribuíram para as mortes que temos visto no Rio de Janeiro e São Paulo serão efetivamente responsabilizados criminalmente ou, pelo menos, administrativamente.
O clima está mudando depois que ajustamos a posição do termostato do planeta para “gratinar lentamente”. Mas o que aconteceu no Rio e em São Paulo poderia ser minimizado. Alguém disse na TV: “Ah, mas na Austrália também está chovendo”, então o o problema não é só do Rio ou de São Paulo. Claro, e lá também houve centenas de mortos por conta das águas?
E apesar dos lamúrios das classes mais abastadas, que normalmente apenas ficam presas no trânsito, demorar para voltar para casa é o de menos. Como já disse aqui antes, pelo menos há a certeza de que ainda há uma casa para se voltar. O problema é quem chega e encontra a cozinha, a sala, o quarto, o banheiro alagados ou carregados pela lama. Aqui em São Paulo, o governo está alardeando que o problema no Jardim Pantanal foi resolvido. Diz isso para uma conhecida minha que mora por lá e está vendo sua casa alagar com esgoto, que está fazendo o caminho inverso do esperado e brotando no banheiro.
Nas últimas madrugadas, barracos deslizaram, crianças morreram soterradas. E nos próximos dias, continuaremos a ver as cenas de sempre: alguém será levado pela correnteza e famílias perderão tudo, sendo alojadas em ginásios de escolas públicas. Vão ganhar espaço na mídia, mas o debate vai durar só até o asfalto secar. É principalmente na periferia, onde gente vale menos. Ou melhor, vale em anos pares…
Seria épico se, um dia, uma grande chuva chegasse escura no meio da tarde. Veriam, em pouco tempo, tratar-se de um pé d’água bíblico, maior que as tempestades habituais que atingem paulistas e cariocas. E começasse a cair apenas sobre o Palácio das Laranjeiras, o Palácio dos Bandeirantes e as prefeituras de ambas as cidades. Poderia incluir aí também uma chuva localizada sobre a casa dos governantes. A água subiria com o lixo entupindo as bocas de lobo e inundaria tudo, encharcaria tapetes, afogaria alguns carros e arrastaria colchões.
Talvez, com isso, fossem implantadas ações habitacionais e de saneamento para amenizar o sofrimento desse povaréu, que foi empurrado para as várzeas, vales de rios e encostas de morros pela especulação imobiliária e a pobreza. Dividindo a mesma situação, talvez enxergassem no outro não apenas um personagem da matéria da TV ou um voto. Afinal, com aqueles que foram assassinados pelo descaso, morre junto um pouco de todos nós e de nossa dignidade. Não pergunte por quem os sinos dobram. Os sinos dobram por ti.
Nas chuvas que assolaram o Rio em abril do ano passado, o prefeito do Rio Eduardo Paes criticou os “demagogos” que reclamavam da retirada de populações de áreas de risco na época da seca. Tá, mas a prefeitura queria retirá-los de lá sem uma opção de moradia? O fato é que expulsar é mais fácil, ainda se for para mais longe onde esse povinho não pode reclamar (quiçá, se Deus quiser, fora do município…) e tome vale-coxinha para pagar o aluguel! Na mesma época, ouvi um apresentador de TV dizer algo do tipo “não interessa para onde o pessoal retirado vai, isso não é problema do Estado”. Ah, é? É de quem então?
Agora, Sérgio Cabral, governador do Rio de Janeiro, afirmou: “Educar também é dizer não. Não se pode habitar essas áreas.” Que tal uma paráfrase? “Governar também é dizer sim. Sim, vamos priorizar a construção de moradias dignas para as famílias que nada têm não precisem habitar essas áreas.” O que esses políticos têm na cabeça que falam mais abobrinhas nessa época do ano? É a umidade, é? Alguém acha que o povo gosta de morar em encosta de morro, que é legal ter que viver no único lugar em que ninguém mais quer por falta de opção?
“Prefeito de Teresópolis manda abrir 300 novas covas”, trouxe o UOL Notícias. Pessoas que provavelmente não tiveram direito a um cantinho ao longo de anos de luta finalmente ganharão, em definitivo, a parte que lhes cabe neste latifúndio.
Acordei imaginando quando é que os ocupantes de cargos públicos (de hoje e de ontem) que, através de sua incompetência ou indiferença, contribuíram para as mortes que temos visto no Rio de Janeiro e São Paulo serão efetivamente responsabilizados criminalmente ou, pelo menos, administrativamente.
O clima está mudando depois que ajustamos a posição do termostato do planeta para “gratinar lentamente”. Mas o que aconteceu no Rio e em São Paulo poderia ser minimizado. Alguém disse na TV: “Ah, mas na Austrália também está chovendo”, então o o problema não é só do Rio ou de São Paulo. Claro, e lá também houve centenas de mortos por conta das águas?
E apesar dos lamúrios das classes mais abastadas, que normalmente apenas ficam presas no trânsito, demorar para voltar para casa é o de menos. Como já disse aqui antes, pelo menos há a certeza de que ainda há uma casa para se voltar. O problema é quem chega e encontra a cozinha, a sala, o quarto, o banheiro alagados ou carregados pela lama. Aqui em São Paulo, o governo está alardeando que o problema no Jardim Pantanal foi resolvido. Diz isso para uma conhecida minha que mora por lá e está vendo sua casa alagar com esgoto, que está fazendo o caminho inverso do esperado e brotando no banheiro.
Nas últimas madrugadas, barracos deslizaram, crianças morreram soterradas. E nos próximos dias, continuaremos a ver as cenas de sempre: alguém será levado pela correnteza e famílias perderão tudo, sendo alojadas em ginásios de escolas públicas. Vão ganhar espaço na mídia, mas o debate vai durar só até o asfalto secar. É principalmente na periferia, onde gente vale menos. Ou melhor, vale em anos pares…
Seria épico se, um dia, uma grande chuva chegasse escura no meio da tarde. Veriam, em pouco tempo, tratar-se de um pé d’água bíblico, maior que as tempestades habituais que atingem paulistas e cariocas. E começasse a cair apenas sobre o Palácio das Laranjeiras, o Palácio dos Bandeirantes e as prefeituras de ambas as cidades. Poderia incluir aí também uma chuva localizada sobre a casa dos governantes. A água subiria com o lixo entupindo as bocas de lobo e inundaria tudo, encharcaria tapetes, afogaria alguns carros e arrastaria colchões.
Talvez, com isso, fossem implantadas ações habitacionais e de saneamento para amenizar o sofrimento desse povaréu, que foi empurrado para as várzeas, vales de rios e encostas de morros pela especulação imobiliária e a pobreza. Dividindo a mesma situação, talvez enxergassem no outro não apenas um personagem da matéria da TV ou um voto. Afinal, com aqueles que foram assassinados pelo descaso, morre junto um pouco de todos nós e de nossa dignidade. Não pergunte por quem os sinos dobram. Os sinos dobram por ti.
Nas chuvas que assolaram o Rio em abril do ano passado, o prefeito do Rio Eduardo Paes criticou os “demagogos” que reclamavam da retirada de populações de áreas de risco na época da seca. Tá, mas a prefeitura queria retirá-los de lá sem uma opção de moradia? O fato é que expulsar é mais fácil, ainda se for para mais longe onde esse povinho não pode reclamar (quiçá, se Deus quiser, fora do município…) e tome vale-coxinha para pagar o aluguel! Na mesma época, ouvi um apresentador de TV dizer algo do tipo “não interessa para onde o pessoal retirado vai, isso não é problema do Estado”. Ah, é? É de quem então?
Agora, Sérgio Cabral, governador do Rio de Janeiro, afirmou: “Educar também é dizer não. Não se pode habitar essas áreas.” Que tal uma paráfrase? “Governar também é dizer sim. Sim, vamos priorizar a construção de moradias dignas para as famílias que nada têm não precisem habitar essas áreas.” O que esses políticos têm na cabeça que falam mais abobrinhas nessa época do ano? É a umidade, é? Alguém acha que o povo gosta de morar em encosta de morro, que é legal ter que viver no único lugar em que ninguém mais quer por falta de opção?
“Prefeito de Teresópolis manda abrir 300 novas covas”, trouxe o UOL Notícias. Pessoas que provavelmente não tiveram direito a um cantinho ao longo de anos de luta finalmente ganharão, em definitivo, a parte que lhes cabe neste latifúndio.
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